domingo, 31 de outubro de 2010

Crónica da abertura do ano pastoral

O tempo novo e a vocação de sempreNo passado Sábado, 24 de Outubro, como vinha sendo avisado, um punhado de leigos mais inseridos na pastoral do Carmo e a comunidade religiosa residente, corporizou o início formal do novo Ano Pastoral. Pelas 16:00h, na Sala dos Terceiros, rezámos, reflectimos e animámo-nos; pelas 18:00h, na Eucaristia de Compromisso, consagramos as nossas vontades, desejos e esforços, ao serviço da Comunidade. E Deus que tudo viu a todos aceitou. Segue a crónica de quem viveu o acontecimetno desde dentro.

Em Dia Mundial de Oração pelas Missões, a Comunidade Carmelita de Viana do Castelo, deu início formal ao novo Ano Pastoral 2010/2011. Mais do que um início, foi um re-encher de pulmões para dar continuidade a um novo ano de actividades.
Depois de um merecido período de férias, ou, se quiserem, de um período de menos agenda e mais coração, há que voltar a reunir energias para, de forma intencionalizada, cumprirmos, em Comunidade, o mandato do Senhor: “Sede minhas testemunhas”.
Um tempo novo para integrarmos no nosso agir a vocação a que todos os cristãos são chamados: ser missionários.
Missionários?! Sim, missionários!
Facilmente colamos esta vocação ao acto de deixar tudo, fazer uma pequena mala e partir para bem longe da terra que nos viu nascer e na qual fomos aprendendo a ser gente; provavelmente, destinados a viver num qualquer país longínquo com irmãos de cor e hábitos bem diferentes dos nossos.
Mas Deus que marcou o nosso coração com o espírito missionário, nem sempre nos propõe fazer a mala! Geralmente pede-nos que sejamos missionários em locais e contextos bem mais próximos do nosso umbigo: na nossa família, com os nossos vizinhos, no local de trabalho, nos contextos de lazer e até na comunidade cristã em que estamos inseridos e onde crescemos e ajudamos a crescer nesta vida de Deus que se deseja sempre mais e mais fecunda!
Pertinho, não?!
Mas, para tal, temos que nos deixar incendiar pelo Amor de Deus… Deixarmos que em nós se ateie aquela chama de amor que em nós foi colocada no dia do nosso Baptismo. Uma chama pequenina que tal como a pequena nascente de um rio tem sede de crescer para gerar vida… Uma vida que não se extingue… Uma vida que se enriquece quando partilhada e que assume a sua plenitude quando deixamos que Deus a integre de uma forma total e absoluta, sem reservas nem condições.
Só com esta dinâmica seremos dignos de receber de S. Paulo o testemunho que nos legou ao ver chegar o fim dos seus dias na terra: “Combati o bom combate, terminei a minha carreira, guardei a fé. (…) O Senhor esteve a meu lado (…), para que, por meu intermédio, a mensagem do Evangelho fosse plenamente proclamada e todas as nações a ouvissem (…).”
E então, a nossa pequena chama só tem um destino/vocação: ser incêndio! Deixar que por nosso intermédio, Deus chegue a todos os corações sedentos da verdadeira felicidade
Foi nesta toada de dinamismo e envio que o Frei João, Prior da Comunidade dos Padres Carmelitas Descalços de Viana do Castelo, animou todos os leigos presentes na Eucaristia que solenemente deu início ao novo Ano Pastoral. N’Ela louvamos o Senhor pelos dons que concede a cada um, n’Ela suplicamos o dom da fidelidade e da perseverança para mais um ano de trabalho, n’Ela nos comprometemos a ser generosos na concretização diária da nossa vocação missionária!
Resta-nos deixar que Deus cumpra a sua vontade na nossa vida, para que o mundo entenda que só o Amor de Deus é gerador de vida plena e abundante!
Que assim seja!
Julieta Palma

Chama do Carmo I NS 82 I 31 de Outubro 2010

domingo, 24 de outubro de 2010

Homilia do Padre Provincial na Eucaristia da Consagração dos neo Professos Solenes

Divino Menino Jesus de Praga
Honramos os mistérios da vossa encarnação e acolhemos nesta celebração as graças da solenidade da vossa Teresa.
Menino, quem sois Vós, entrado e perdido nestes claustros? Onde está a vossa Mãe, Menina dos vossos olhos?  Que cuidados Vos trouxeram aqui? Estes vossos fiéis foram convidados para a celebração do louvor e da acção de graças pela vossa obra redentora e por terdes associado a Vós a vossa Santa Mãe, a nossa Santa Madre e estes queridos irmãos mais novos no Carmelo, que se propõem professar perpetuamente. Queremos, ainda, dar início às celebrações do jubileu deste convento. Há 50 anos fostes desejado, escolhido e proclamado Rei e Senhor desta casa. Nestes poucos anos, esta casa deu muitas voltas à volta do vosso trono que permanece no mesmo lugar: tudo mudou e muitas vezes, só Vós não Vos mudastes, embora tenhamos tentado meter-Vos nas modas dos tempos breves. Dizem que essa vossa imagem grande fica mal ao clássico Menino Jesus. E essa coroa real a coroar cabelos e vestidos de realeza foi objecto de reparo por um príncipe da Igreja no tempo da sua administração apostólica. Também nesta casa, foi difícil a vossa santa infância. Mas valeu a pena a adoração dos pastores desta terra e dos magos estrangeiros, da profetisa Ana e do velho Simeão. Os ritos da circuncisão e da apresentação no templo também tiveram lugar nesta terra que Vos tem por cidadão de honra, a ponto de dedicar ao vosso Santuário a tortuosa avenida que a ele conduz. Estranhos caminhos dos homens por onde Vós peregrinais nas viagens de exílio e regresso do Egipto. Afinal, quem sois Vós, entrado e perdido nestes claustros?  Trocais honras por favores e nessas mais valias nos mandais ocupar o tempo da noite e do dia. Que cuidados e trabalhos Vos ocupam nesta casa? Chamais os de longe e acolheis os de perto. Pagais uma hora ao preço de uma jornada e não fazeis acepção entre os que suportam os trabalhos do dia e os ociosos que esperam na praça até à última hora, a hora mais feliz do dia. Viestes à quinta da Moria para tomar posse das terras da Mariana, a filha única que, em tempos difíceis, edificou o mosteiro das carmelitas do Porto para a sua comunidade e ajudou os carmelitas com esta herança. Estranha forma de vida: a vossa e a dos vossos seguidores. Por isso tendes poucos trabalhadores da primeira à última hora, por isso tendes tão poucos amigos.
E vós, Madre Teresa, que tendes para nos dizer neste dia da vossa festa? Como bem sabeis, ao longo deste ano procurámos estudar o livro da vossa vida santa e aprendemos que a escola é a mesma do Mestre, do qual os judeus diziam: «Como é que Ele tem tanta instrução, sem ter estudado?». A resposta foi proclamada na leitura do Livro da Sabedoria: «Orei e foi-me dada a prudência; implorei e veio a mim o espírito de sabedoria. ... Amei-a mais do que a saúde e a beleza e decidi tê-la como luz, porque o seu brilho jamais se extingue. Com ela me vieram todos os bens e, pelas suas mãos, riquezas inumeráveis. Regozijei-me com todos estes bens, porque me vieram com a Sabedoria, mas eu ignorava que ela fosse a sua mãe. Aprendi-a com lealdade, comunico-a sem inveja e não escondo a riqueza que a Sabedoria encerra, porque ela é para os homens um tesouro inesgotável, e os que a adquirem alcançam a amizade de Deus, recomendados pelos benefícios da sua doutrina». Ah, Santa Madre, quanta sabedoria nesse coração orante, onde nascem os rios da água viva do Espírito Santo. Na nossa ignorância, falamos de oração, mas não rezamos. Rezamos, mas não estamos com Aquele que nos ama. Reunimo-nos algumas vezes por dia para a oração, mas estamos poucas vezes a sós com Aquele que nos ama. Santa Madre, intercedei por nós para que as lições do livro da Vida, nos ajudem a saborear o Caminho da Perfeição. Esta graça seja concedida hoje com maior abundância a estes três jovens que deixaram as suas longínquas terras de Angola e de Timor para se dedicarem ao serviço da santidade e da unidade da Igreja, mediante a oração assídua do Carmelo e a penitência alegre dos votos religiosos. Teresa de Jesus, agora desposada para sempre com o Jesus de Teresa, abençoai e tornai fecundas as vidas destes jovens que hoje enxertais solenemente no Carmelo para que produzam abundantes frutos na missão da Ordem em Angola e em Timor. E quando chegar essa hora, eles sejam generosos em repartir pelos seus irmãos o que hoje recebem pela mediação desta comunidade.
        Divino Menino Jesus, a história destes 50 anos de presença em Avessadas atesta a verdade dos vossos prodígios em Praga. As guerras da religião continuam ferozes e em cada baixa no exército de Elias a vossa imagem é profanada entre os escombros. Erguei-vos mutilado – morto e ressuscitado –, e tomai mãos e pés nestes corações que o Espírito Santo consagra em rios de água viva, destinados a regar terras queimadas pela guerra e a purificar cemitérios profanados. As cinco profissões solenes deste ano sejam conforto no desânimo que se abateu sobre nós e transformem o sentimento de abandono que os nossos pecados merecem em esperança vocacional dum futuro mais conforme a fé teresiana: «Nada te perturbe, / Nada te espante; / Tudo passa, / Só Deus não muda. //A paciência tudo alcança, / Quem a Deus tem, / Nada lhe falta, / Só Deus basta». As próximas ordenações sacerdotais confirmem a vossa palavra: «Quanto mais Me honrardes mais vos favorecerei». Seja este Santuário, que Vos é dedicado, uma escola da Teresa de Jesus, onde a oração seja a fonte de todos os bens, tesouro inesgotável e sabedoria divina. Seja esta celebração um encontro de cada um de nós convosco à volta da mesa da palavra que ilumina e do Corpo e Sangue que nos sustenta. Seja este gesto homilético um serviço à oração da Igreja, lugar privilegiado do vosso encontro de amizade connosco. Falai e convertei a Vós o nosso coração obstinado e mais atento às vozes dos homens do que à vossa palavra. A homilia hoje foi para Vós, Divino Menino Jesus de Teresa e Teresa de Jesus Nossa Santa Madre. E o que ficou por dizer a esta assembleia em oração fica depositado no vosso coração. Vós que viveis e reinais com Deus Pai, na unidade do Espírito Santo, Deus, por todos os séculos dos séculos. Amen.
(O prometido é devido. Esta foi a homilia do nosso Padre Provincial proferida na Eucaristia do dia 15, Solendiade de Santa Teresa de Jesus e Profissão Solene dos Irmão Daniel, Noé e Nuno.)

Missões Carmelitas

Os Carmelitas Descalços são missionários:
No seu carisma,
Nos seus santos,
Na oração missionária das irmãs contemplativas,
Nos frades carmelitas que partem para terras de missão,
Nos leigos missionários carmelitas que assumem o seu compromisso baptismal,
Nos muitos institutos missionários da família carmelita...
Santa Teresa de Jesus quis que as suas filhas e filhos rezassem pelas missões
e marcassem presença nos lugares mais dispersos da terra.
A Província Portuguesa dos Carmelitas Descalços, a exemplo de outras províncias da Ordem, que possuem missões nos países africanos, latino-amercianos e no Oriente,
sempre acalentou a ideia de desenvolver um projecto missionário num país africano de expressão portuguesa.
Possuímos até Abril de 1974 uma comunidade masculina e outra feminina em Angola e Moçambique.
Mas as perturbações das guerras da independência obrigaram-nos a regressar.
Mas não desistimos.
Actualmente, estamos muito empenhados em retomar a nossa presença nestes países africanos.
A nossa colaboração com alguns projectos destes países são portas abertas
para podermos concretizar este sonho quando chegar a hora.

Dia Mundial das Missões

As Missões Carmelitas, na pessoa dos seus padres e leigos, apoia vários projectos missionários nos países africanos e em Timor Leste. Nesta secção vamos listando várias necessidades muito concretas, para as quais solicitamos a sua colaboração. À medida que nos for ajudando, se assim o desejar, vamos somando as quantias recebidas e quando reunirmos o montante necessário envia-lo-emos para o respectivo país e Missão, onde se aplicará na resolução de cada caso. - ajudar a remodelar os dormitórios do Orfanato da Missão de S. Roque;
- ajudar a custear as viagens de 3 jovens timorenses, candidatos a carmelitas, e que querem vir para Portugal receber a formação teológica.
(http://missoes.carmelitas.pt/casoacaso/casoacaso.php)

sábado, 23 de outubro de 2010

Condições para rezar

Mais que um título, é uma obrigação ser-se missionário!

O Dia Mundial das Missões foi criado no ano de 1926 pelo Papa Pio XI, com a intenção de que em toda a Igreja Católica se renovasse o ardor pela vida missionária, com o desejo de que os cristãos sentissem o apelo de viver Cristo para além das próprias fronteiras, para nos desafiarmos a nós próprios a sermos universais e missionários. Todos os discípulos de Cristo somos como Ele: todos para todos.
Outubro é o Mês das Missões; este quarto domingo é o Dia das Missões. Neste ano somos sensibilizados pelo tema «Missão e partilha», e pelo lema: «Ouvi o clamor do meu povo».
Este domingo recorda-nos que todos somos chamados à responsabilidade pela missão. «Ai de mim se eu não evangelizar», dizia o Apóstolo Paulo. Todo o cristão é missionário. Porém, nem o ser cristão nem o ser missionário é um título de glória do qual retiremos rendimentos ou nos possamos orgulhar, mas antes uma obrigação e uma responsabilidade ingentes.
Um cristão adulto e responsável vive, respira e actua como missionário, apoia as missões com o seu tempo, suporta-as com a sua ajuda monetária, reza pelos missionários, entrega-se pessoalmente às missões por um período de tempo ou por toda a vida, semeia a alegria de ter sido encontrado por Cristo e não descansa sem ter alargado esse contágio que ilumina a vida, chama para Cristo.
O Domingo das Missões é o nosso domingo, é o domingo de todos!
Em 1990, num texto sobre a vida missionária da Igreja o Papa João Paulo II escreveu: «O Dia Mundial das Missões, orientado à sensibilização para o problema missionário, mas também para a recolha de fundos, constitui um momento importante na vida da Igreja, porque ensina como se deve dar o contributo: na celebração eucarística, ou seja, como oferta a Deus, e para todas as missões do mundo.» E ainda: «Quanto às ajudas materiais, é importante ver o espírito com que se dá. Para isso torna-se necessário rever o próprio estilo de vida: as missões não solicitam apenas uma ajuda, mas uma partilha do anúncio e da caridade para os pobres. Tudo o que recebemos de Deus — tanto a vida como os bens materiais — não é nosso, mas foi-nos confiado em uso. Que a generosidade no dar seja sempre iluminada e inspirada pela fé! Estamos em crise e a deitar contas à vida. Aqui e ali vê-se claramente que os tostões são (ou começam a ser) contados, que os gastos são (mais) pensados. Talvez esse seja um benefício da crise. É certo que a crise nos posicionou diferentemente na vida (ou vai fazê-lo). Os impostos subiram, as regalias diminuíram, os benefícios fiscais quase desapareceram, ou foram-se de todo. Talvez a crise nos traga a sabedoria do viver austero, a beleza da frugalidade. Talvez tenha chegado o momento de batermos no peito e nos reconhecermos pecadores porque esbanjadores, maus cristãos porque afeitos a comezainas solenes e a grandes celebrações gastronómicas, homens e mulheres imperfeitos e egoístas porque pensamos quase só com o estômago e estragamos levianamente, quando, se fôssemos mais responsáveis, poupavamos mais, gastavamos menos e com a nossa partilha fraterna aconchegavamos a muitos que passam fome de pão, cultura e dignidade.
A crise algo nos há-de ensinar. Talvez a poupar como há anos se fazia. E oxalá, a repartir. É Dia das Missões, é dia de reaprender a repartir. Outros antes que nós e mais que nós foram fuzilados pela crise. Reaprenderemos a partilhar? Estou crente que sim. Abraçar a responsabilidade de ser-se missionário obriga a ter como resposta o regresso da fraternidade e o repartir do pão e do ganho arrancado nas duras canseiras da vida.
O Baptismo faz de nós cristãos, outros cristos. Como Cristo. É Ele a quem imitamos e seguimos. É olhando-O que aprenderemos a fazer como Ele. Essa é a nossa credibilidade e a força que emprestamos ao anúncio. Sermos cristãos é sermos missionários. Não podemos ser cristãos sem sermos dEle e como Ele: cristãos missionários! (Que outros não há!)
Sou eu, és tu, de Cristo? És pobre e feliz como Cristo? Livre e límpido como Cristo? Pedra de toque e palavra de Evangelho como Cristo?
Talvez, portanto, não haja de ir-se para longe para se ser seu missionário, imagem sua, cristão!


Chama do Carmo I NS 81 I 24 de Outubro de 2010

domingo, 17 de outubro de 2010

O que professo diante de vós, diante de vós o quero viver!

Chamo-me Frei Daniel Jorge, tenho 29 anos, sou angolano. Desde muito pequeno me senti chamado a colaborar no serviço aos irmãos, na obra santificadora de Cristo. Agradeço aos meus pais que sendo evangélicos (protestantes) me permitiram manifestar os meus sentimentos e me ajudarem a descobrir e a seguir o meu verdadeiro caminho. Aos 12 anos separei-me dos pais e fui viver com os meus tios e lá encontrei um clima familiar católico que contribuiu para me decidir em querer seguir, servir e viver Cristo.
Entretanto, ouvi falar dos Carmelitas. Mas nós não estamos em Angola. Por essa razão solicitei ao Arcebispo D. Zacarias Kamwenho a minha entrada no Seminário da Arquidiocese do Lubango, onde estudei Filosofia. Ali vivi de forma gratificante e agradeço aos meus formadores que contribuíram para o meu amadurecimento e identificação com o perfil e as exigências de um futuro sacerdote. Hoje continuo a dar resposta ao chamamento divino na Ordem dos Carmelitas e creio ser o lugar certo. A ordem carmelitana, contemplativa e activa é verdadeiramente uma escola mística de oração, e através da oração comunitária e individual, do silêncio meditativo e contemplativo, da vida fraterna e, do apostolado como assistentes de vida espiritual, é para mim o ícone perfeito dum estilo de vida que vale viver deixando tudo para a viver e amar, na procura da santificação própria e dos irmãos, procurando ser congruente com o projecto de vida.
Os desafios que a Ordem e a Igreja hoje nos colocam é a acção evangelizadora num mundo onde a palavra de ordem é o consumo e o conforto. Fazer-se religioso, ser ministro do culto, é dar respostas às necessidades e angústias espirituais do povo, cultivar a maturidade humana, afectiva e espiritual, por amor. A Igreja sente a necessidade de formar homens capazes de cultivar e desenvolver valores e atitudes humanas, numa doação alegre, espiritualmente sólida para poder ajudar a comunidade a ser santa. Para isso me fiz religioso e com o auxílio divino vou conseguir. Nas minhas orações tenho pedido pelas vocações de especial consagração — sacerdotes, religiosos, leigos consagrados e missionários —, para que mais jovens escutem a chamada do Senhor e O sigam pelos caminhos entusiasmantes da consagração ao Senhor. Tal só depende da generosidade dos cristãos.
Cristo é a origem de toda a vocação: é Ele quem conhece e chama através de mediações humanas. Muitas vocações se perdem porque nunca ninguém lhes disse: – Tu nunca pensaste em seres padre, religioso(a) ou missionário?
Cristo é o modelo dos vocacionados, pela generosidade com que abraçou a missão recebida do Pai, até ao dom supremo e plenamente livre da Sua própria vida, ao morrer por todos nós.
Não podemos falar de vocação sem falar da de Maria. Para ser a Mãe do Salvador, Maria «foi enriquecida por Deus com dons dignos para tamanha função». Na Anunciação o Anjo Gabriel saudou-a como «cheia de graça»! Efectivamente, para poder dar o assentimento livre de sua fé ao anúncio da sua vocação era preciso que estivesse totalmente sob a moção da graça de Deus. E assim Ela se tornou o modelo de vocação perfeita, através da unção do Espírito Santo.
Gostaria de lançar o convite a todos: Juntos rezemos pelas vocações, para que os jovens escutem a voz de Cristo; as crianças aprendam a amá-l’O; os pais e avós falem das diferentes vocações aos seus filhos e netos; as famílias cristãs sejam geradoras de vocações, e reconheçam a necessidade de corrigir uma certa perda de estima pela vocação sacerdotal, a par duma difusa acção educativa. Pedimos maior criatividade e coragem na proposta da vida sacerdotal aos jovens e no acompanhamento do processo de decisão. A transmissão da fé não pode esquecer em momento algum a proposta vocacional, dirigida a todos, em todas as fases da vida, aberta a todas as vocações e ministérios. Possa a voz deste chamamento encontrar eco no coração inquieto de muitos jovens. Que as famílias cristãs sejam um viveiro de vocações.
Neste dia da minha Profissão Solene como Carmelita Descalço gostaria de me recomendar às vossas orações, a fim de conservar este dom que acabo de receber. Assim como diante de vós fiz os meus votos solenes, diante de todos vós os quero cumprir!
Que o fulgor da corte celeste infunda e imprima em vós e nas vossas famílias abundantes bênçãos.
Fr. Daniel Jorge de São José Sachipangue

Chama do Carmo I NS81 I 17 de Outubro de 2010

As mãos

Com mãos se faz a paz se faz a guerra.
Com mãos tudo se faz e se desfaz.
Com mãos se faz o poema - e são de terra.
Com mãos se faz a guerra - e são a paz.

Com mãos se rasga o mar. Com mãos se lavra.
Não são de pedras estas casas, mas
de mãos. E estão no fruto e na palavra
as mãos que são o canto e são as armas.

E cravam-se no tempo como farpas
as mãos que vês nas coisas transformadas.
Folhas que vão no vento: verdes harpas.

De mãos é cada flor, cada cidade.
Ninguém pode vencer estas espadas:
nas tuas mãos começa a liberdade.

Manuel Alegre

sábado, 16 de outubro de 2010

Na mão de Deus

Na mão de Deus, na sua mão direita,
descansou afinal meu coração.
Do palácio encantado da Ilusão
desci a passo e passo a escada estreita.

Como as flores mortais como que se enfeita
a ignorância infantil, despojo vão,
depus do Ideal e da Paixão
a forma transitória e imperfeita.

Como criança, em lôbrega jornada
que a mão leva no colo agasalhada
e atravessa sorrindo vagamente,

selvas, mares, areias do deserto....
Dorme o teu sono, coração liberto,
dorme na mãos de Deus eternamente!

Antero de Quental

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Uma celebração, tantas celebrações!

Hoje foi um dia grande para a família. Grande porque era dia de Santa Teresa de Jesus. Grande porque o Santuário do Menino Jesus de Praga começou a celebrar as bodas de ouro da sua fundação. Grande porque os Irmãos Daniel, Noé e Nuno ali se consagraram inteiramente ao Senhor. O Daniel é de Angola; o Noé e o Nuno, de Timor. O Carmelo os juntou e juntos caminharam até se animarem à consagração perpétua das suas vidas ao Senhor.
Presidiu à celebração o Provincial Frei Pedro Ferreira. (A sua bela homilia há-de aparecer aqui logo que possível.) Na assembleia estiveram alguns amigos e familiares. Os amigos era de Avessadas, da comunidade do Porto onde estudaram e também de Viana. Os familiares eram poucos, compreensivelmente. As várias comunidades da Província fizeram representar-se alegremente.
A cerimónia foi serena e escorreita, bem delineada, sem pausas mais que as necessárias. Do altar fomos para a mesa, porque ambas fortalecem os laços familiares. A tarde dispersou-nos, mas não nos separou.
A nossa comunidade de Viana trouxe consigo o Frei Daniel (Na terceira fotografia está emitindo os votos nas mãos do Provincial) para uma Casa que bem conhece, pois aqui foi noviço. Ainda assim, com gosto, lhe dissemos: — Sê bem-vindo, irmão! (E ele encheu os nossos cálices de saboroso licor!)

Dia de S. Teresa de Jesus

Em tempos de tristeza e de inquietação, não abandones nem as boas obras de oração, nem a penitência a que estás habituada. Antes, intensifica-as. E verás com que prontidão o Senhor te sustentará.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Não, Ele também estava lá!

IV Encontro Ibérico de Jovens Carmelitas

Os jovens carmelitas ibéricos estiveram em encontro. Foi do dia 9 ao 11. O IV encontro correu como só pode correr, bem. Tal como correram os outros três. As vozes, neste caso, não são maiores que as nozes. De Porto(gal) foram 0ito.
Estão lançadas as bases para uma bela participação carmelitana nas próximas JMJ em Madrid

domingo, 10 de outubro de 2010

Baptismo da Beatriz

A Beatriz peregrinou hoje ao colo da Mãe. Revelou-se na sua condição de peregrina! Veio da Gafanha da Nazaré ao Carmo de Viana do Castelo. Quem sai aos seus... A Susana e o Pedro são do Carmo Jovem e foi como jovem casal carmelitas que eles pediram o Baptismo para a sua filha.
O amor dos pais trouxe-a à Igreja e o amor do Pai chamou-a ao Baptismo. A partir de hoje, sem que o saiba, do seu coraçãozinho jorram rios de água viva até à eternidade.
Hoje, reunidos à sua volta, prometemos não deixar apagar esta luz pequenina!

sábado, 9 de outubro de 2010

Acção de graças

Dá-nos, Senhor, um coração novo,
capaz de conjugar em cada dia
os verbos fundamentais da Eucaristia:

RECEBER, BENDIZER e AGRADECER,
PARTILHAR e DAR,
COMEMORAR, ANUNCIAR e ESPERAR.

Dá-nos, Senhor, um coração sensível e fraterno,
capaz de escutar e de recomeçar.

Mantem-nos reunidos, Senhor,
à volta do pão e da palavra.

E ajuda-nos a discernir os rumos a seguir
nos caminhos sinuosos deste tempo,
por Ti semeado e por Ti redimido.

Ensina-nos, Senhor,
a saber colher o Teu amor semeado e redentor,
única fonte de sentido que temos para oferecer
a este mundo de que és o único Salvador.

António Couto

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Força, Selecção!


Alegrmo-nos e cantemos!

Das colinas verdes de Timor e das planícies fecundas de Angola o Senhor chamou o Daniel, o Noé e o Nuno. E eles vieram, confiantes. Viveram connosco, nesta pequenina família de Carmelitas Descalços de Portugal.
O Senhor que os chamou é o mesmo Senhor que no próximo dia 15 — Solenidade de Santa Teresa de Jesus — os consagra para Si e para o serviço da Sua Igreja. Demos graças ao Senhor, porque são nossos. São para nós. São de Deus. Alegremo-nos e com os nossos Irmãos cantemos as maravilhas de Deus em suas vidas!
(O Frei Daniel Jorge é desde este Verão membro da nossa Comunidade de Viana do Castelo.)

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Saudação ao Senhor D. Anacleto Oliveira

Hoje, festa de Nossa Senhora do Rosário, o Prior da Comunidade e o P. Caetano entrevistaram-se com o nosso Bispo, D. Anacleto, na sua casa, em Darque.
Este primeiro encontro com o primeiro responsável da Diocese decorreu suave e ameno. Ao Bispo permitiu-lhe conhecer-nos e revelar as suas longínquas raízes carmelitanas. A nós, Carmelitas, a disponibilidade para servir a Igreja.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Celebrar, celebrar o quê?

COMEMORAÇÕES DA REPÚBLICA
Vasco Pulido Valente no Público, 2010-10-02

A República foi feita pela chamada "geração de 90" (1890), a chamada "geração do Ultimatum", educada pelo "caso Dreyfus" e, depois, pela radicalização da República Francesa de Waldeck-Rousseau, de Combes e do "Bloc des Gauches" (que, de resto, só acabou em 1909). Estes beneméritos (Afonso Costa, António José d"Almeida, França Borges e outros companheiros de caminho) escolheram deliberadamente a violência para liquidar a Monarquia. O Mundo, órgão oficioso do jacobinismo indígena, explicava: "Partidos como o republicano precisam de violência", porque sem violência e "uma perseguição acintosa e clamorosa" não se cria "o ambiente indispensável à conquista do poder". Na fase final (1903-1910), o republicanismo, no seu princípio e na sua natureza, não passou da violência, que a vitória do "5 de Outubro" generalizou a todo o país.
Não admira que a República nunca se tenha conseguido consolidar. De facto, nunca chegou a ser um regime. Era um "estado de coisas", regularmente interrompido por golpes militares, insurreições de massa e uma verdadeira guerra civil. Em pouco mais de 15 anos morreu muita gente: em combate, executada na praça pública pelo "povo" em fúria ou assassinada por quadrilhas partidárias, como em 1921 o primeiro-ministro António Granjo, pela quadrilha do "Dente de Ouro". O número de presos políticos, que raramente ficou por menos de um milhar, subiu em alguns momentos a mais de 3000. Como dizia Salazar, "simultânea ou sucessivamente" meio Portugal acabou por ir parar às democráticas cadeias da República, a maior parte das vezes sem saber porquê.

E , em 2010, a questão é esta: como é possível pedir aos partidos de uma democracia liberal que festejem uma ditadura terrorista em que reinavam "carbonários", vigilantes de vário género e pêlo e a "formiga branca" do jacobinismo? Como é possível pedir a uma cultura política assente nos "direitos do homem e do cidadão" que preste homenagem oficial a uma cultura política que perseguia sem escrúpulos uma vasta e indeterminada multidão de "suspeitos" (anarquistas, anarco-sindicalistas, monárquicos, moderados e por aí fora)? Como é possível ao Estado da tolerância e da aceitação do "outro" mostrar agora o seu respeito por uma ideologia cuja essência era a erradicação do catolicismo? E, principalmente, como é possível ignorar que a Monarquia, apesar da sua decadência e da sua inoperância, fora um regime bem mais livre e legalista do que a grosseira cópia do pior radicalismo francês, que o "5 de Outubro" trouxe a Portugal?
(Adaptação do prefácio à 6.ª edição do meu livro O Poder e o Povo).

Nunca mais

Nunca mais
A tua face será pura limpa e viva
Nem o teu andar como onda fugitiva
Se poderá nos passos do tempo tecer.
E nunca mais darei ao tempo a minha vida.

Nunca mais servirei senhor que possa morrer.
A luz da tarde mostra-me os destroços
Do teu ser. Em breve a podridão
Beberá os teus olhos e os teus ossos
Tomando a tua mão na sua mão.

Nunca mais amarei quem não possa viver
Sempre,
Porque eu amei como se fossem eternos
A glória, a luz e o brilho do teu ser.
Amei-te em verdade e transparência
E nem sequer me resta a tua ausência.
És um rosto de nojo e negação
E eu fecho os olhos para não te ver.

Nunca mais servirei senhor que possa morrer.

(Sophia de Mello Breyner)

O que tem isto a ver com o Centenário da República?


domingo, 3 de outubro de 2010

De pequenino

O papá Carlos ALberto conhece bem o Seminário. O filho Vicente não, mas leva caminho. Ontem o pai veio ver as novidades, o filho tudo via e ouvia como novidade. Espantaram-no sobretudo os sinos. E uma caneta preta que lhe foi passada pela mão do Prior. (A mamá não deve ter gostado muito, mas...)
A boa disposição foi tanta que nem um nem outro querem falhar a próxima oportunidade. E nós cá os esperamos, pois de pequenino...

Brasil a votos

Aumenta a nossa fé!

Senhor, eu creio: Aumenta a minha fé!
Tu conheces o meu coração,
Tu vês o temor que há em mim,
de me confiar perdidamente em Ti.
Tu sabes como o desejo de viver isoladamente a minha vida
é em mim tão forte, que me faz muitas vezes afastar de Ti.

Todavia, eu creio!
Diante de Ti está o meu desejo e a minha fraqueza.
Orienta aquele, ampara esta.
Ajudando-me a fazer afogar em Ti todos os meus sonhos
e todos os meus anseios e projectos,
para confiar em Ti e não em mim
e nas presunçosas evidências deste mundo que passa.

Faz que eu saiba lutar conTigo:
mas não permitas que eu vença!
Tu que és o Senhor do meu temor,
dos meus anseios e da minha esperança,
eu Te suplico: aumenta a minha fé!

Bruno Forte

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Esperança

“Esperar a vida eterna significa jamais querer perder o olhar de Deus, porque Ele é a nossa vida.”

 (Card. Ratzinger).

Carta de Albino Luciani a Teresinha

Em Junho de 1973, centenário do nascimento de Santa Teresinha, o futuro Papa João Paulo I escreveu estas linhas:

Cara Teresinha,
Eu tinha dezassete anos quando li a sua autobiografia. Foi para mim como um raio. "História de uma florzinha de Maio", definiu-a. A mim pareceu a história de "uma barra de aço" pela força de vontade, pela coragem e pela decisão que ela exala. Escolhida uma vez a estrada da completa dedicação a Deus, nada lhe impede o passo: nem doença, nem contradição externa, nem nuvem ou trevas interiores.
Recordo-me que quando me levaram doente para o sanatório, em anos nos quais penicilina e antibióticos não tendo sido inventados, ao doente se predizia, mais ou menos vizinha, a morte, eu me envergonhei. Envergonhei-me de provar um pouco de medo: "Teresa com vinte anos, até então sã e cheia de vitalidade – disse a mim mesmo –, foi inundada de alegria e de esperança, quando sentiu subir à sua boca a primeira emoptise. Não só, mas, atenuando o mal, trata de levar a termo o jejum em regime de pão seco e água, e tu, queres temer? És sacerdote, desperta-te, não sejas tonto!"
Relendo-vos, por ocasião do centenário do nascimento (1873-1973), tocou-me o modo com o qual amastes a Deus e ao próximo. Santo Agostinho escreveu: "Caminhemos para Deus não com o caminhar, mas com o amar". Também Vós chamastes à vossa estrada "via do amor". Cristo tinha dito: "Ninguém vem a mim se o meu Pai não o atrair". Em perfeita linha com estas palavras, Vós vos sentistes como um "passarinho sem força e sem asas"; em Deus, porém, vistes a águia que descia para levar-vos às alturas sobre suas próprias asas.
À graça divina chamastes "elevador", que vos elevava a Deus rapidamente e sem fadigas, sendo "muito pequena para subir a áspera escada da perfeição". Escrevi acima: "sem fadigas". Entendamo-nos: isto sobre um aspecto; sobre um outro, porém... Somos [a contemplar] aos últimos meses; a vossa alma avança em uma espécie de galeria obscura, não vê nada daquilo que antes via claramente. "A fé, escrevestes, não é um véu, mas um muro!" Os sofrimentos físicos são tais que a fizestes dizer: "Se não tivesse a fé, dar-me-ia à morte". Não obstante isto continuastes a dizer com a vontade ao Senhor que o amava: "Canto a felicidade do Paraíso, mas sem provar alegria; canto simplesmente que quero crer". As últimas palavras vossas foram: "Meu Deus, eu vos amo!" Ao amor misericordioso de Deus vos oferecestes como vítima. Tudo isto não vos impedia de gozar das coisas belas e boas: antes da última doença com alegria vós pintastes, escrevestes poesias e pequenos teatros sacros, interpretando algumas partes com gosto de uma fina actriz.
Na última doença, em um momento de retoma, pedistes alguns bombons de chocolate. Não tivestes medo das vossas próprias imperfeições, nem mesmo de algumas vezes adormeceres pelo cansaço durante a meditação ("os meninos dão prazer às mães também quando dormem!"). Amando o próximo, vos esforçastes por tornar os pequenos serviços úteis mas escondidos e de preferir as pessoas que vos incomodavam e que menos consideravam o vosso carácter. Por detrás do seu rosto pouco simpático buscavas o rosto simpaticíssimo do Cristo. E não davas conta deste esforço e desta busca: "Quanto é mística, na capela e no trabalho – escrevia sobre Vós a priora – e da mesma forma é bem humorada a ponto de fazer-nos soltar em risos durante a recreação". Estas poucas linhas, que sublinhei, estão bem longe de conter a vossa completa mensagem aos cristãos. Bastam, todavia, para assinalar algumas directivas para nós.
O verdadeiro amor de Deus casa-se com a firme decisão tomada e, quando necessária, renovada. O indeciso Enéia do Metastasio, que disse: "Intanto confuso, nel dubbio funesto, non parto, non resto" não era vestido pelo verdadeiro amor de Deus. Mais adaptado ainda é o vosso compatriota o Marechal Foch que durante a batalha da Marna telegrafava: "O centro do nosso exército cede, a esquerda se retira, mas eu ataco assim mesmo!" Um pouco de combatividade e de amor ao risco não diminui no amor ao Senhor. Vós o tivestes: não é à toa que sentistes em Joana D'Arc uma "irmã de armas". No "Elixir do amor" de Donizetti bastou a "furtiva lágrima", despontada sobre a face de Adina, para serenar e fazer beato o enamorado Nemorino.
Deus não se contenta somente de lágrimas furtivas. Ele gosta de uma lágrima quando a ela corresponde dentro, na vontade, uma decisão. Assim é também com relação às obras externas: essas são agradáveis ao Senhor só se correspondem a um amor interno. O jejum religioso tinha até mesmo desfigurado as faces dos fariseus, mas a Cristo não agradou aquelas esquálidas faces, porque sabia que o coração dos fariseus estava distante de Deus. Vós escrevestes: "O amor não deve consistir nos sentimentos, mas nas obras". E acrescentastes: "Deus não tem necessidade das nossas obras, mas só do nosso amor". Perfeito! Com Deus se pode amar um monte de outras belas coisas. Com um pacto: nada seja amado contra ou sobre ou na mesma medida de Deus. Por outras palavras: o amor a Deus não deve ser exclusivo, mas prevalente, ao menos na estimação.
Jacob enamorou-se um dia de Raquel: para tê-la, prestou serviço por sete anos, que "lhe pareceram, diz a Bíblia, poucos dias, de tanto que a amava" e Deus não teve nada a reprovar, antes o abençoou. Aspergir água benta e bendizer todos os amores deste mundo é uma outra coisa. Infelizmente de tanto fazê-lo hoje algum teólogo, influenciado pelas ideias de Freud, Kinsey e Marcuse, elogia a "nova moral sexual". Se não querem a confusão, contrariamente a estes teólogos, os cristãos deverão olhar para o Magistério da Igreja, que goza de especial assistência, seja para conservar intacta a doutrina de Cristo, seja para adaptá-la de modo conveniente aos tempos novos. Buscar o rosto de Cristo no rosto do próximo é o único critério que nos garante de amar seriamente todos, superando antipatias, ideologias e meras filantropias.
Um rapaz, escreveu o velho arcebispo Perini, bate uma tarde à porta de uma casa: está com roupa de festa, uma flor na orelha, mas, dentro, o coração lhe bate forte: quem sabe como a moça e os seus familiares acolherão o pedido de matrimónio que ele timidamente quer fazer? Para abrir a porta vem a moça em pessoa. Uma olhada e fica toda ruborizada, o prazer evidente (falta a "furtiva lágrima") da senhorita serena-o, o coração se alarga. Entra; ali está a mãe da moça; parece-lhe simpaticíssima, veio-lhe até o desejo de abraçá-la. Está o pai, viu-o centenas de vezes, mas nesta tarde parece-lhe transfigurado por uma luz especial. Mais tarde chegam os dois irmãos; abraços e saudações calorosas. Pergunta-se Perini: o que sucede a este jovem? O que são todos estes amores desabrochados improvisadamente como fungos? Resposta: não se trata de amores, mas de um amor só: ama a rapariga e o amor que lhe tem difunde-se sobre todos os seus parentes. Quem ama seriamente a Cristo não pode rejeitar o amor aos homens, que de Cristo são irmãos. Ainda que sejam feios, maus e incómodos, o amor deve transfigurar-lhes um pouco.
Amor em gotas. Às vezes é o único possível. Não tive jamais a ocasião para pular na água de uma torrente para salvar alguém que estivesse em perigo; mas muitíssimas vezes me foi pedido que emprestasse alguma coisa, de escrever cartas, de dar modestas e fáceis indicações. Não encontrei jamais um cão hidrófobo pela rua; mas muitas moscas e pernilongos; jamais tive perseguidores que me batessem, mas muitas pessoas que me incomodam falando forte pela rua, com o volume da televisão um pouco alto ou, ainda, com pessoas que fazem um certo rumor quando tomam a sopa. Ajudar como se pode, não levar muito a sério, ser compreensivos, manter-se calmos e sorridentes (o mais possível) nestas ocasiões, é amar o próximo sem retórica, mas num modo prático. Cristo muito praticou esta caridade. Quanta paciência em suportar as desavenças que os Apóstolos faziam entre si. Quanta atenção no encorajar e louvar: "Jamais encontrei tanta fé em Israel", diz do Centurião e da Cananeia: "Vós ficastes comigo também nos momentos difíceis", diz aos Apóstolos. E uma vez pede, por favor, a barca de Pedro. "Cheio de toda cortesia", disse Dante. Sabia colocar-se na veste dos outros, sofria com eles. Protegia, defendia, além de perdoar os pecadores: assim a Zaqueu, assim à adúltera, assim à Madalena.
Vós, em Lisieux, caminhastes no rasto dos seus exemplos; nós devemos fazer o mesmo no mundo. Carnegie conta daquela senhora que um dia preparou para os seus homens, marido e filhos, a mesa bem preparada e florida, mas com um punhado de feno sobre cada prato. "O quê? Feno nos dais hoje? lhe disseram. "Oh, não - respondeu -, vos trago logo o almoço. Mas deixai que vos diga uma coisa: há anos que vos preparo a comida, procuro variar, uma vez o arroz, uma outra a sopa, ora o assado, ora cozido, etc. Jamais dissestes: "Está bom! Parabéns!" Dizei por favor uma palavra, não sou de pedra! Não se pode trabalhar sem um reconhecimento, um encorajamento, só para o rei da Prússia!"
Pode ser um vintém também a caridade privatizada ou social. Está em acção uma greve justa: pode dar-se que isto traga dificuldades para mim, que não sou directamente interessado pelo que acontece. Aceitar o incómodo, não murmurar, sentir-se solidário com os irmãos, que lutam pela defesa de seus direitos, é também caridade cristã. Pouco notada, mas nem por isso menos importante.
Uma alegria misturada ao amor cristão. Aparece já no canto dos Anjos em Belém. Faz parte da essência do Evangelho, que é "novidade alegre". É característica dos grandes santos: "Um Santo triste, dizia Santa Teresa de Jesus, é um triste santo". "Aqui, entre nós, dizia São Domingos Sávio, nos fazemos santos com a alegria". A alegria pode transformar-se em caridade refinada, como Vós fazíeis nas recreações do Carmelo, aos outros. O irlandês da lenda que, morto imprevistamente, chegou ao tribunal divino, estava não pouco preocupado: o balanço da sua vida era-lhe muito magro. Havia uma fila diante dele e ele via e ouvia. Depois de ter consultado o grande registo, Cristo disse ao primeiro da fila: 'Vejo que eu tinha fome e tu me destes de comer. Bravo! Entra no Paraíso!" Ao segundo: "Tinha sede e tu me destes de beber". E a um terceiro: "Estava na prisão e me visitastes". E assim por diante. Por cada um que era convidado para entrar no Paraíso o irlandês fazia um exame e sempre encontrava algo que temer: ele não tinha dado de comer, nem de beber, não tinha visitado encarcerados nem doentes. Quando chega a sua vez, tremia, olhando o Cristo, que estava examinando o registo. Mas eis que Cristo levanta os olhos e lhe diz: "Não tem muita coisa escrita. Porém alguma coisa você fez: eu estava triste, amuado, cabisbaixo e você me contou algumas piadas, me fez rir e me deu coragem. Paraíso!"
É uma lenda, mas sublinha que nenhuma forma de caridade deve ser desprezada ou desvalorizada. Teresa, o amor que levastes a Deus (e ao próximo por amor de Deus) foi verdadeiramente digno de Deus. Assim deve ser o nosso amor: chama que se alimenta de tudo o que em nós é grande e belo; renúncia a tudo o que em nós é rebeldia; vitória que nos prende sobre as asas e nos leva em presente aos pés de Deus.

+ Albino Luciani, Card.

O pequeno barco

«Santa Teresa a Grande eu amo muito... mas a Pequena: ela nos conduz ao porto. É preciso pregar a sua doutrina tão necessária.
Teresa de Lisieux foi grande por ter sabido, na humildade, na simplicidade, na constante abnegação, cooperar nas dificuldades e no trabalho da graça para o bem de inúmeros fiéis.
Recordo-me de quando observava o porto de Constantinopla: Lá chegavam grandes navios de carga, que porém não conseguiam, pela natureza do fundo do mar, a aproximar-se do cais. Portanto, eis que, ao lado de cada grande navio, encostava um pequeno barco, cuja presença à primeira vista parecia supérflua, e, ao invés, era muito preciosa, pois o barco tinha a tarefa de transportar as mercadorias até o porto.»