Somos Carmelitas Descalços, filhos de Santa Teresa de Jesus e São João da Cruz, Ordem dos Irmãos da Bem-aventurada Virgem Maria do Monte Carmelo, Senhora do Sim, nossa Mãe e nossa Irmã, em Viana do Castelo, Alto Minho, Portugal, a viver «em obséquio de Nosso Senhor Jesus Cristo e a servi-l’O de coração puro e consciência recta».
terça-feira, 31 de dezembro de 2013
Gratidão pelos benefícios recebidos
Pai omnipotente,
generoso distribuidor de todos os bens,
nós Vos damos graças pelos vossos benefícios
e humildemente Vos suplicamos
que, tendo sido conservados sãos e salvos
pela vossa infinita bondade,
sejamos sempre protegidos à sombra das vossas asas.
Por Nosso Senhor Jesus Cristo na unidade do Espírito Santo.
Amen.
O doce Jesus!
segunda-feira, 30 de dezembro de 2013
domingo, 29 de dezembro de 2013
Três palavras
Algumas semanas atrás, nesta praça, disse que, para levar por diante uma família, é necessário usar três palavras. Três palavras: com licença, obrigado, desculpa. Três palavras-chave!
FRANCISCO
FRANCISCO
Apressa-te, menino
Apressa-te menino e cresce devagar
Das tuas mãos pequenas e abertas
O testemunho do amor há de passar
Às nossas velhas mãos que tu apertas.
António Couto
Oração do Papa Francisco pelas famílias
Jesus, Maria e José
a vós, Sagrada Família de Nazaré,
hoje, dirigimos o olhar
com admiração e confiança;
em vós contemplamos
a beleza da comunhão no amor verdadeiro;
a vós confiamos todas as nossas famílias;
para que se renovem nessas maravilhas da graça.
Sagrada Família de Nazaré,
escola atraente do santo Evangelho:
ensina-nos a imitar as tuas virtudes
com uma sábia disciplina espiritual,
doa-nos o olhar claro
que sabe reconhecer a obra da providência
nas realidades cotidianas da vida.
Sagrada Família de Nazaré,
guardiã fiel do mistério da salvação:
faz renascer em nós a estima pelo silêncio,
torna as nossas famílias cenáculo de oração
e transforma-as em pequenas Igrejas domésticas,
renova o desejo de santidade,
sustenta o nobre cansaço do trabalho, da educação,
da escuta, da recíproca compreensão e do perdão.
Sagrada Família de Nazaré,
desperta na nossa sociedade a consciência
do caráter sagrado e inviolável da família,
bem inestimável e insubstituível.
Cada família seja morada acolhedora de bondade e de paz
para as crianças e para os idosos,
para quem está doente e sozinho,
para quem é pobre e necessitado.
Jesus, Maria e José
a vós com confiança rezamos,
a vós com alegria nos confiamos.
Bem-aventuranças da Família
2. Bem-aventuradas as famílias que diariamente combatem o analfabetismo dos afetos. Sejamos em família artesãos do afeto, num amor que nos aceita por inteiro, que abraça o que somos e o que não somos, o que nós já fomos e aquilo em que nos tornámos. Mesmo se as panelas ou os pratos andarem lá em casa pelo ar, ninguém se deite nem adormeça sem primeiro fazer as pazes!
3. Bem-aventuradas as famílias que compreendem a importância do inútil. Não deixemos que nenhum membro da família se torne descartável pelo facto de não ser útil ou lucrativo! Estar juntos, em casa, sem fazer nada, é tão necessário, como trabalhar, para ganhar o pão de cada dia. Os mais novos e os idosos, que não fazem nada, fazem-nos mais falta, do que o trabalho que nos dão! Saibamo-los ouvir e aprender com eles e seguir em frente, com sabedoria!
4. Bem-aventuradas as famílias que cultivam uma arte da lentidão. Na pressão de decidir, precisamos de uma lentidão, que nos proteja das precipitações mecânicas, de gestos cegamente compulsivos, de palavras fatais ou banais. Rezar, juntos, em família, também nos modera a pressa e nos modela na arte do amor paciente de Deus para connosco!
5. Bem-aventuradas as famílias que não deitam fora a caixa dos brinquedos. Em família, brincar é uma coisa tão necessária e tão importante como trabalhar e falar a sério! Brinquem a sério! A sério, brinquem mais uns com os outros.
6. Bem-aventuradas as famílias que arriscam fazer bom uso das crises. Mudar de vida, não significa tornar-se outro, ou, pior ainda, partir para outra… (para outra pessoa, outra experiência…). Quanto mais conscientes dos nossos entraves, limites e contradições, mas também das nossas forças e capacidades, tanto mais poderemos dar-nos conta de quem somos e do lugar que ocupamos, na vida dos outros! A crise não se destina a afundar, mas a aprofundar a relação!
7. Bem-aventuradas as famílias que se assumem como um laboratório para a alegria, uma escola do sorriso, um ateliê para a esperança, uma fábrica para o abraço e para a dança. Aquilo que mais pesa na vida é não receber um sorriso, é não se sentir querido. Em vez de crescermos na severidade, na intransigência, na indiferença, na maledicência, no lamento, cresçamos na alegria, na simplicidade, na gratidão e na confiança.
8. Bem-aventuradas as famílias que vivem abertas às surpresas do futuro e põem a sua confiança em Deus. O «sim» do amor, dado, pelo casal, e para sempre, «na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, todos os dias da nossa vida» conta com a graça do Sacramento do Matrimónio. Esta graça, não é uma decoração para uma cerimónia bonita; é para tornar fortes os casais, para os fazer corajosos, a fim de que possam seguir em frente! Mas se o sonho do casamento se tornar um pesadelo, se algum de vós se sentir rejeitado, tende ainda esta confiança: Deus não desiste de nenhum de vós; o seu amor por cada um de vós não volta atrás!
José Tolentino Mendonça
Queres ser minha mãe
Um jornal diário relatou uma história comovente, no contexto da guerra do Afeganistão: Amin é uma criança de 11 anos. Regressa à aldeia, vinda do campo. A sua casa está destruída, a sua irmã morta, o pai pede socorro, o resto da família desaparecida sob os escombros dos bombardeamentos. Amin socorre o pai, consegue arrastá-lo para cima de uma carroça e parte à procura de ajuda. Mas também o pai morre logo no início do percurso. Amin não volta a casa, tem medo, enceta o longo caminho dos refugiados, percorre algumas centenas de quilómetros, até um campo de acolhimento, perto da fronteira. Encontra no campo uma mulher e pergunta-lhe: não queres ser minha mãe? A resposta não se faz esperar: porque não? O marido está de acordo; é mais um filho a juntar aos outros quatro. Refugiados também eles, acabavam de se inscrever no campo. Voltam lá para inscrever Amin, que ainda não sabe os seus nomes, mas já sabe que tem novos pais e que nunca mais os abandonará. A grandeza da mulher mãe, cujo coração não tem fronteiras e cuja ternura não se esgota, independentemente da religião ou da cultura.
Perante o drama das crianças no mundo contemporâneo, todas as mulheres são chamadas a ser mães e todos os homens a serem pais, dos filhos que geraram e de tantos outros que os podem regenerar, fazendo renascer em si a alegria e a esperança.
O burro e o presépio
Certa vez, um jumento conseguiu entrar, ninguém sabe como, numa igreja. Era tempo de Natal e num canto da capela o povo tinha organizado um belo presépio. O jumento ficou olhando todo aquele cenário. Não faltava nada. Tinha a estrela, as ovelhas, os pastores, os magos e tantas outras figurinhas de joelho em adoração. Finalmente o jumento reconheceu um seu semelhante, pequeno como os outros, mas com certeza seu parente. Chegou à conclusão de que tudo aquilo devia servir para celebrar o culto do jumento. Com um suspiro de saudade o animal pensou: "Antigamente, sim, os jumentos eram importantes. Deviam ser os donos do mundo!".
Sagrada Família
sábado, 28 de dezembro de 2013
Como são os teus rituais?
Natal. Não gostamos de pensar. Talvez por que os músculos não estejam treinados, ou, talvez, por que cada vez tenhamos mais músculos e menos com que pensar. Ainda não sei ao certo as linhas da equação. Sei que pensar tem os seus custos. Pelo sexto ano consecutivo erguemos na comunidade a Exposição de Presépios com a colaboração de uns e de outros, ajudas, empréstimos e o gozo e alegria discretos de muitos. Todos os anos há uma novidade. Pequenina que seja é uma novidade. Este ano ela dá que pensar. Mais uma vez. Por favor entre nos claustros e contemple. Perca por ali uns minutos e isso é ganho. Não incomoda ninguém e até nos alegra a sua visita. Talvez para si tudo seja novo, talvez já não seja a primeira vez que vem e até se lembra da do ano passado. Talvez encontre uma novidade que não a minha. Não importa. O interessante é que vá por ali, deixando o olhar correr, pousar e descansar. Páre onde parar, mas não deixe de pensar: Como são os teus rituais? Eu também páro por lá. Natal é memória, ritual e celebração. É por isso que nasceu o presépio, para ajudar a memória a actualizar o acontecimento santo da Incarnação do Verbo de Deus. Ele nasceu no meio do frio da nossa história e a história o tem representado em quadros cheios de simplicidade e beleza que nos encantam e aconchegam a alma e a fé.
Natal é celebração, é presente. Presente presencial, como se fosse agora. Como se fosse agora que as pousadas se vão novamente fechando à Virgem grávida e o Altíssimo de novo voltasse a nascer num curral.
Natal é ritual, é tradição, é repetição de gestos, movimentos e palavras que vão passando de mão em mão, de coração a coração, que entram, luminosos, pelos olhos até ao fundo da alma.
O ritual do Natal é maravilhamento de luz! Ora sucedeu neste Natal vir uma família cumprir um ritual: trazer um presépio novo para a exposição. Que tenha vindo a família toda: papá, mamã e Eva, já de si é muito significativo! (O papá ergueu o presépio e a mamã ajudou no que pôde, porque a Eva andava à volta pelos claustros encantada com tantos Jesuses !)
O presépio destes jovens tem que se lhe diga, ou melhor: tem que se veja. Vale a pena entrar nos claustros só por ele. Ele é um imenso paralelepípedo cheio de luz; na parte de cima tem um Menino Jesus e uma árvore bonsai seca. De um ramo seco da árvore pende uma pequena rodela de laranja seca sugerindo... Sugerindo o que você quiser que ela sugira. Por isso será melhor que passe por lá.
Ora na noite antes da noite de Natal, quais reis magos, andávamos por ali três zarandeando pelos claustros. E mais uma vez o presépio de luz nos bateu nos olhos, e ao bater bateu-nos a frase que lhe serve de legenda: «Como são os teus rituais?» E foi então que alguém sugeriu que respondêssemos. Olhando de novo o Menino e a pergunta, as respostas foram:
(1) Tudo estava seco, ressequido e duro. Toda a terra estava como que desértica e seca como aquele bonsai seco, até que nasceu o Menino Deus que a tudo deu sentido; nasceu a Vida e a vida em volta reverdesceu. Assim, não há como esperar o Natal mais um ano para deixarmos animar e reverdecer em nós a esperança. Aquele presépio ali é como um grito a dizer-nos: tende esperança! Confiai! O que estava ressequido vai renovar-se, a vossa alegria vai voltar a animar as cidades dos homens!
(2) O Segundo disse: O tempo passa. Aquela rodela de laranja suspensa da árvore é um relógio a dizer-nos que o tempo passa depressa, inexoravelmente, e que, inexoravelmente, estamos impedidos de o deter. A vida é uma roda que roda e ninguém pára. Roda a roda até se cansar e desaparecer.
(3) O Terceiro disse: Há rituais e rituais. Uns são de vida, outros são de morte. Há neste presépio noite e luz, vida e morte. Tal como no mundo, no nosso mundo. O Natal está a chegar e nós vamos encantar-nos de mistério e de luz, do mistério da Luz que nos apareceu. Mas ao lado do acontecer do Mistério há árvores que morrem, há vida que não reage nem se encanta nem se maravilha com a chegada da Vida. Neste Natal será mais uma vez Natal. Correremos muito gastando aqui, ali e além os últimos centavos em prendas quase simbólicas. Para manter o ritual. As famílias vão juntar-se e iremos repetir rituais seculares: quem puder terá as mesas fartas, quem souber cantará cantigas de embalar. Depois do calor e do aconchego enfrentaremos o frio da noite, como pastores vigilantes, para ir à Missa do Galo ver o Menino que a Senhora tem. E o Terceiro continuou: É mais uma vez Natal. Mas há muitos rituais que não são Natal. Não são de vida nem de morte, são de nada e de sem--sentido. Existem famílias que já não se juntam, já não cantam nem se beijam, nem rezam juntas nem rejubilam com o Nascimento. Comem o mais cedo que podem, mas já não comem frente a frente. Comem sandes enquanto actualizam o Facebook, longe da lareira e com as Doc Martens calçadas prontos a dar corda aos sapatos e zarpar para a discoteca.
Eu concordo que os rituais possam mudar, mas alguns têm de ser como raízes, daquelas fundas, tão fundas que tenham entrado pelo tecto da caverna do presépio e ali tenham beijado a Luz.
Chama do Carmo I NS 209 I Dezembro 29 20013
sexta-feira, 27 de dezembro de 2013
Os ricos e os pobres
quinta-feira, 26 de dezembro de 2013
quarta-feira, 25 de dezembro de 2013
Presépio do Carmo
Ouve dizer-se muitas que o Carmo é como o presépio, ou seja: Jesus Cristo está no centro e é todo o nosso Ai Jesus!; de um lado está Nossa Senhora contemplando o filho; do outro lado está São José, Patriarca da Igreja e cuidador da Sagrada Família; diante deles estão os que vão adorar o Menino: pastores, gentes do campo, representantes de outras culturas.
Feliz Natal
Boas Festas
Nós, Carmelitas de Viana do Castelo,
saudamos com júbilo
e em nome de Deus feito menino
a todos os nos familiares e amigos,
aos nossos benfeitores
e a quantos fazem connosco o caminho da fé,
em direcção a Deus que veio.
A todos agradecemos a oração e a ajuda,
a amizade e o carinho,
e lhes desejamos santas festas da Encarnação
e um ano novo fortalecido pelo alento de Deus
que não temeu nascer, viver e caminhar connosco.
A Comunidade do Carmo
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São João da Cruz
Se houver Natal
Se houver Natal, que seja branco. Mesmo que não seja com neve.
Se houver Natal, que seja branco. Com a pureza dos gestos. Com a sinceridade dos sentimentos. Com a candura do sorriso. Com a intensidade das palavras. Com a transparência da vida.
Se houver Natal, que seja luminoso. Não necessariamente com luzes.
Se houver Natal, que seja luminoso. Com a luz da esperança em tempos sombrios. Com a luz da fé em tempos de obscuridade. Com a luz da verdade em tempos de conivência arrastada com a mentira.
Se houver Natal, que seja santo. Não somente com os santos de ontem.
Se houver Natal, que seja santo. Com a santidade de hoje. Com a santidade dos que não desistem. Com a santidade dos que não se exibem. Com a santidade dos que reconhecem os erros. Com a santidade dos que ousam, dos que abraçam, dos que choram, dos que sabem amar.
Se houver Natal, que seja simples. Não com uma simplicidade desleixada. Até porque a simplicidade não é desleixo.
Mas se houver Natal, que seja simples. Sem ostentação nem gastos sumptuosos. Que seja um Natal mais vivido com a presença do que com presentes. Que seja um Natal na humildade e na companhia dos humildes.
Se houver Natal, que seja autêntico. Não com uma autenticidade seca, lacónica.
Mas se houver Natal, que seja autêntico. Que seja um Natal cristão. Sim, um Natal com presépio por fora, mas sobretudo com um presépio por dentro. Que seja um Natal solidário e não solitário. Que seja um Natal a dividir e a multiplicar. Que seja um Natal sem a volúpia do lucro, mas com a felicidade da partilha.
Se houver Natal, que seja quente, que seja cálido, que seja caloroso, apesar do frio.
Se houver Natal, não nos aqueçamos apenas à lareira. Procuremos reaquecer os corações que teimam em continuar gelados.
Enfim, se houver Natal, que seja logo, que seja longo.
Se houver Natal, que seja já, que seja agora.
Que seja sempre Natal!
Um Natal Feliz!
Vítor Araújo
Conto de Natal
O nosso menino
nasceu em Belém.
Nasceu tão-somente
para querer bem.
Nasceu sobre as palhas
o nosso menino.
Mas a mãe sabia
que Ele era divino.
Vem para sofrer
a morte na cruz,
o nosso menino.
Seu nome é Jesus.
Por nós ele aceita
o humano destino:
louvemos a glória
de Jesus Menino.
M. Bandeira
nasceu em Belém.
Nasceu tão-somente
para querer bem.
Nasceu sobre as palhas
o nosso menino.
Mas a mãe sabia
que Ele era divino.
Vem para sofrer
a morte na cruz,
o nosso menino.
Seu nome é Jesus.
Por nós ele aceita
o humano destino:
louvemos a glória
de Jesus Menino.
M. Bandeira
Santo Natal
E como se desprendiam
os Anjos do Céu!
E com que alegre revolteio
desde o tecto se aproximavam de Maria!
Como batiam com as asas sobre os vidros
das janelas, tal
como se desfaz a espuma!
Como encheram de plumas
o presépio!
A. Canales
Noite de Natal, noite de escândalo!
Comentou um paroquiano com o seu pároco: – Eu gosto muito do Natal, mas o que eu gosto mesmo é da noite de Natal.
– Então, porquê, perguntou o sacerdote?
– Por causa do escândalo, respondeu o paroquiano.
– Por causa do escândalo, atreveu-se a perguntar, surpreso, o pároco?
– Sim, padre. Se você fosse Deus aceitaria fazer-se humano? Por acaso não seria melhor ser Deus no Céu, seja lá onde o céu fôr que ser homem-Deus na terra? Quem vivendo no céu aceitaria viver a pobreza humana cheia de limitações e fracassos? Não é isso um escândalo?
Os primeiros e os últimos
terça-feira, 24 de dezembro de 2013
Natal com Chesterton - Parte IV e fim
Há por aí algumas contradições sobre o Natal – e, de fato, sobre as tradições cristãs em geral. Elas são aparentes em indivíduos que nos afirmam, em jornais e outros lugares, que se emanciparam de dogmas, e agora se propõem a viver o espírito do cristianismo. A que eu respondo: “Ok. Vá em frente,” ou palavras similares. Mas então sempre me encontro confrontado com este fato extraordinário. Eles começam a viver o espírito do cristianismo, e lançam-se freneticamente a impedir as pessoas pobres de beberem cerveja, impedir as nações oprimidas de se defenderem contra os tiranos (porque isso pode levar à guerra), a tirar crianças deficientes de seus pais e trancá-las em algum tipo de sanatório materialista, etc. E então eles ficam surpresos quanto digo-lhes que eles tem muito menos o espírito do que a letra do cristianismo, do que suas palavras, do que a terminologia de seus dogmas. De fato, eles mantiveram algumas das palavras e terminologia, palavras como paz, justiça e amor; mas fazem essas palavras significarem uma atmosfera completamente estranha ao cristianismo; eles mantiveram a letra e perderam o espírito.
E tal como acontece com o cristianismo, assim também com o Natal. Se os homens soubessem exatamente o que querem dizer com Natal, e então começassem a criar novos símbolos, novas cerimônias, novas brincadeiras, isso poderia ser uma coisa boa. Algo do tipo pode acontecer, muito provavelmente, naquele mundo dos homens modernos que sabem o que o Natal significa. Mas a maior parte das modificações que são discutidas nas revistas e em outros lugares são o exato reverso disso. Elas são realmente modos por meio dos quais os homens podem manter o nome de Natal, e uns poucos esmaecidos símbolos natalícios, enquanto fazem algo totalmente diferente.
G. K. Chesterton
Mishna
Chamava-se Mishna. Tinha uns olhos muito vivos e teria uns seis anos.
Quando a educadora contemplou o presépio que ele tinha feito depois da explicação do Natal, ficou surpreendida ao ver não um menino na manjedoira, mas dois.
Maravilhado chamou um tradutor para que perguntasse a razão de haver dois meninos no seu presépio.
Mishna cruzou os braços e observando o seu presépio, começou a repetir a história com muita seriedade, e para ser a primeira vez que a tinha escutado contou-a muito bem.
Terminado o relato, acrescentou: Quando Maria pôs o bébé na manjedoira, Jesus olhou para mim e perguntou-me se eu tinha um lugar onde ficar. Eu disse-lhe que não tinha nem mamã tem papá, e que não tinha lugar para onde ir. Então jesus disse-me que podia ficar ali com Ele.
Eu disse-lhe que não podia, porque não tinha nenhuma prenda para lhe dar. Mas eu queria ficar com Ele. E por isso pus-me a pensar no que poderia eu oferecer ao Menino. Lembrei-me que lhe poderia oferecer um pouco de calor. E perguntei a Jesus: Se eu te der um bocadinho de calor, isso seria uma boa prenda para ti? Jesus disse-me que sim, que essa seria a melhor prenda que poderia receber. E foi por isso que me meti dentro do presépio.
Jesus olhou para mim e disse-me que poderia ficar ali para sempre.
Onde está Deus?
Dois irmãos de dez e doze anos eram o terror do bairro. Em todas as travessuras que nele sucediam ali estavam os dois. Os pais, esgotada paciência, não sabiam o que fazer com eles.
Tendo ouvido falar de um padre que trabalhava com rapazes delinquentes a mãe pediu-lhe que falasse com os filhos. O sacerdote aceitou dizendo-lhe que primeiro falaria com o mais novo. E a mãe ali o levou.
O sacerdote mandou-o sentar-se para o fazer entender que Deus está em todo o lugar e tudo vê. Com o dedo apontou para o rapaz e perguntou-lhe: — Onde está Deus?
O miúdo não disse nada.
De novo os sacerdote lhe apontou o dedo e lhe perguntou: — Onde está Deus?
O rapaz nada respondeu.
Pela terceira vez, com voz forte e firme, e de dedo em riste quase a tocar o nariz do moço, perguntou-lhe: — Onde está Deus?
O rapaz assustou-se tanto que saiu a correr e só parou em casa. Ao chegar encontrou-se com o irmão e subiram juntos para o quarto onde planeavam todas as maldades. E disse-lhe: Agora sim! Agora estamos metidos em grandes sarilhos! O irmão mais velho perguntou-lhe em que grandes sarilhos é que se tinham metido. E o pequeno respondeu: Não encontram a Deus e pensam que fomos nós que O escondemos!
Querem matar o Natal
O faraó quis matar o Natal
mantado os meninos dos hebreus insubmissos,
mas uma menina tirou o bébé das águas dos crocodilos.
O rei acaz não apreciava bébés
mas guerreiros que lhes resguardassem o trono,
mas uma menina deu à luz o Emanuel.
O rei herodes quis matar Yoshua filho de Maria,
porque só apreciava reinos sem meninos,
mas o menino emigrou ao colo da mãe.
Há reis que só vendem e por isso alimentam
máquinas de luzinhas a piscar,
mas o menino era luz na noite a brilhar.
Há reis que só vendem e por isso alimentam
máquinas da morte de tantos menino sem nascer,
mas o menino nasceu sem poder comprar.
Há reis que vivem na sua caverna sentados
escrevendo leis em dura pedra quadrada,
mas entre animais está o menino deitado.
De charuto obeso na mão alguns abrem
a porta fechada
para beber sozinhos o whisky secular.
segunda-feira, 23 de dezembro de 2013
Natal com Chesterton - Parte III
A caridade do Natal pode, em certo sentido, cobrir todos os homens, mas não pode, de nenhum modo, cobrir todos os princípios, senão ela cobriria o princípio da falta de caridade. É autoevidente à primeira vista que o Natal é tanto conservador quanto liberal, desde que evitemos letras maiúsculas em ambas as palavras. O Natal não seria nada se não conservasse as tradições de nossos pais; não seria nada se não desse com liberalidade aos nossos irmãos. Conservar o Natal envolve a admissão de que o mundo já possui tradições valorosas e honoráveis de um tipo local e doméstico. Ajudar os pobres no Natal envolve em si mesmo a admissão de que o mundo não possui uma distribuição econômica satisfatória, que nem tudo no mundo está bem, ou próximo do bem. Em outras palavras, o Natal, sendo uma instituição cristã, já contem em si as duas ações alternativas em relação à sociedade: a preservação do que foi bom no passado e a remoção do que é ruim no presente. Em épocas mais simples, essas coisas poderiam ter tomado formas mais simples: a primeira na forma de brinde e a segunda na forma de generosidade. Mas em qualquer forma, ou em qualquer grau, elas envolvem logicamente duas verdades que se equilibram, verdades que se complementam, embora não raro pareçam contraditórias: que, em certo sentido, as coisas devem ser como são, enquanto que em outro sentido elas não são como deveriam ser.
G. K. Chesterton
O MIlagre de Mogo
Terminada a ceia a família preparou-se para a Missa do Galo. E um ano mais o patriarca despotricou com costume tão infantil. Quem é que pode acreditar que Deus se faça uma bolinha humana? Isso é absurdo, irracional, uma fábula, repetia Mogo.
E insistia: Estou de acordo que se celebre o solstício de inverno com uma boa ceia e que nos alegremos com os dias que se enchem de luz. Mas jamais acreditar que o Todopoderoso será envolvido em paninhos.
A sua esposa Berta, acostumada à vinagreira anual do marido, respondeu: «Deus faz-se um de nós, para que nós não tenhamos medo e O sigamos até nos salvarmos. Anda, acende o teu cachimbo e fuma, fica à lareira e cuida da casa, que nós vamos adorar o Menino Deus.»
Enquanto Mogo fumava ouviu uma batida na janela, depois outra, e depois muitas mais. Algum engraçadinho, pensou ele, esta a divertir-se a atirar bolas de neve às janelas! Calçou as botas, vestiu um casaco e foi inspeccionar o jeitoso.
A sua surpresa foi grande quando viu um bando de pardais saltando na neve.
Estes pobres animais, disse, desorientaram-se com o frio no seu voo para o sul. Se eu pudesse fazer algo eles não morrerão esta noite…
O bom do Mogo foi então ao estábulo, acendeu as luzes e abriu as portas de par em par. Pensou que se batesse as palmas os desorientados pardais entrariam para se aquecer. Mas os pardais não são como as galinhas e só conseguiu que se assustassem ainda mais e se dispersassem.
Estes pássaros, repetiu entre dentes, estão tão tontos que só se assustam e não percebem que os quero ajudar. Se eu pudesse ao menos converter-me em pardal começaria a voar para o calor do estábulo e eles haveriam de me seguir e evitariam morrer de frio.
Apenas se deu conta dos seus pensamentos, Mogo parou, limpou a neve da cara e caiu de joelhos, gemendo: oh, meu Deus! Meu Deus! Não foi precisamente isso que a Berta me disse: «Deus faz-se um de nós, para que nós não tenhamos medo e O sigamos até nos salvarmos?» Como pude ser tão tolo?
Selou o cavalo e deitou a correr para a igreja, deixando as portas abertas do estábulo e as luzes acesas. Quando chegou cantavam canções. Ele aproximou-se da família e abraçou-os chorando. Regressaram juntos e Mogo contou o que tinha sucedido. Ao chegarem a casa o bando de pássaros dormia nas vigas do celeiro com as cabeças debaixo da asa.
Antes de se deitar Mogo espalhou grão pelo chão. Na manhã seguinte, dia de Natal, toda a família viu que os pássaros e o grão tinham desaparecido.
Paul H. Dunn
E insistia: Estou de acordo que se celebre o solstício de inverno com uma boa ceia e que nos alegremos com os dias que se enchem de luz. Mas jamais acreditar que o Todopoderoso será envolvido em paninhos.
A sua esposa Berta, acostumada à vinagreira anual do marido, respondeu: «Deus faz-se um de nós, para que nós não tenhamos medo e O sigamos até nos salvarmos. Anda, acende o teu cachimbo e fuma, fica à lareira e cuida da casa, que nós vamos adorar o Menino Deus.»
Enquanto Mogo fumava ouviu uma batida na janela, depois outra, e depois muitas mais. Algum engraçadinho, pensou ele, esta a divertir-se a atirar bolas de neve às janelas! Calçou as botas, vestiu um casaco e foi inspeccionar o jeitoso.
A sua surpresa foi grande quando viu um bando de pardais saltando na neve.
Estes pobres animais, disse, desorientaram-se com o frio no seu voo para o sul. Se eu pudesse fazer algo eles não morrerão esta noite…
O bom do Mogo foi então ao estábulo, acendeu as luzes e abriu as portas de par em par. Pensou que se batesse as palmas os desorientados pardais entrariam para se aquecer. Mas os pardais não são como as galinhas e só conseguiu que se assustassem ainda mais e se dispersassem.
Estes pássaros, repetiu entre dentes, estão tão tontos que só se assustam e não percebem que os quero ajudar. Se eu pudesse ao menos converter-me em pardal começaria a voar para o calor do estábulo e eles haveriam de me seguir e evitariam morrer de frio.
Apenas se deu conta dos seus pensamentos, Mogo parou, limpou a neve da cara e caiu de joelhos, gemendo: oh, meu Deus! Meu Deus! Não foi precisamente isso que a Berta me disse: «Deus faz-se um de nós, para que nós não tenhamos medo e O sigamos até nos salvarmos?» Como pude ser tão tolo?
Selou o cavalo e deitou a correr para a igreja, deixando as portas abertas do estábulo e as luzes acesas. Quando chegou cantavam canções. Ele aproximou-se da família e abraçou-os chorando. Regressaram juntos e Mogo contou o que tinha sucedido. Ao chegarem a casa o bando de pássaros dormia nas vigas do celeiro com as cabeças debaixo da asa.
Antes de se deitar Mogo espalhou grão pelo chão. Na manhã seguinte, dia de Natal, toda a família viu que os pássaros e o grão tinham desaparecido.
Paul H. Dunn
domingo, 22 de dezembro de 2013
O presépio somos nós
O Presépio somos nós!
É dentro de nós que Jesus nasce:
Dentro destes gestos que, em igual medida, a esperança e a sombra revestem,
Dentro das nossas palavras e do seu tráfego sonâmbulo,
Dentro do riso e da hesitação,
Dentro do dom e da demora,
Dentro do redemoinho e da prece,
Dentro daquilo que não soubemos ou ainda não tentamos.
O Presépio somos nós!
É dentro de nós que Jesus nasce:
Dentro de cada idade e estação,
Dentro de cada encontro e de cada perda,
Dentro do que cresce e do que se derruba,
Dentro da pedra e do voo,
Dentro do que em nós atravessa a água ou atravessa o fogo,
Dentro da viagem e do caminho que sem saída parece.
O Presépio somos nós!
É dentro de nós que Jesus nasce:
Dentro da alegria e da nudez do tempo,
Dentro do calor da casa e do relento imprevisto,
Dentro do declive e da planura,
Dentro da lâmpada e do grito,
Dentro da sede e da fonte,
Dentro do agora e dentro do eterno!
José Tolentino Mendonça
Natal com Chesterton - Parte II
Toda cerimónia depende de um símbolo; e todos os símbolos têm sido vulgarizados e apodrecidos pelas condições comerciais de nosso tempo. Isso é especialmente verdade desde que sentimos a infecção comercial americana, e o progresso tornou Londres uma cidade não superior a si mesma, mas inferior a Nova York. De todos os símbolos falsificados e esmaecidos, o mais melancólico exemplo é o antigo símbolo da chama. Em todas as épocas e países civilizados, foi sempre natural falar de um grande festival em que “a cidade era iluminada.” Não há sentido atualmente em se falar que a cidade foi iluminada. Não há propósito em iluminá-la por qualquer entusiasmo normal ou nobre, tal como o sair-se vencedor numa batalha. Toda a cidade está já iluminada, mas não por coisas nobres. Está iluminada somente com o propósito de se insistir na imensa importância de coisas triviais e materiais, adornadas por motivos inteiramente mercenários. O significado de tais cores e tais luzes foi, portanto, inteiramente aniquilado. Não adianta lançar um foguete dourado ou púrpuro para a glória do Rei ou do País, ou acender uma imensa fogueira vermelha no dia de São George, quando todos estão acostumados a ver o mesmo alfabeto ardente proclamando uma pasta de dentes ou uma goma de mascar. A nova iluminação não fez a pasta de dentes ou a goma de mascar tão importantes quanto São George ou o Rei George; porque nada poderia. Mas ela fez as pessoas se cansarem do modo de proclamar grandes coisas, por seu eterno uso para proclamar pequenas coisas. A nova iluminação não destruiu a diferença entre a luz e a escuridão, mas permitiu a luz menor ofuscar a maior.
G. K. Chesterton
sábado, 21 de dezembro de 2013
José da Anunciação, o homem a mais na história
São José. A menina Virgem Maria teve a visita de um Anjo; o jovem José também. O Anjo falou em nome de Deus à menina; e a José também. À menina disse-lhe que ia ser mãe, a José que ia ser pai. A menina soube que ia ser por milagre, José soube que o que estava a acontecer era o Milagre. Maria assustou-se com a notícia, José — só podia! — também!
Dificilmente haverá santo mais simpático. Para começar não fala muito e ouve de tudo. Às vezes até penso que é Deus, porque só Deus está à altura de Deus para o educar. Jesus era Deus, e José educou-o. Que grande, que enorme era José! Outras vezes medito no terror que terá sofrido só por lhe ter tocado em sorte a obrigação de acolher a Deus, dar-lhe um nome, apresentá-lo à sociedade, fazer Dele um homem, ensiná-lo a ser bom judeu, ensiná-lo a rezar, dizer-lhe que o Pai era o pai.
Este IV domingo de Advento traz-nos José com as suas dúvidas e a sua fé. Na surpresa da sua anunciação.
Só de pensar nos trabalhos que José houve de passar assusto-me! Ainda bem que era justo; justo e santo. Deus Pai gostava tanto de José que lhe confiou o Filho. Mas não o livrou de uma dificuldade que fosse, não o livrou de medos, nem de surpresas, nem de dúvidas, nem de durezas – as provas da fé.
Trabalhou como carpinteiro. (Se fosse hoje seria – seria, sei lá! –, seria um designer, alguém que com um pouco de magia semeia no cinzento dos dias o calor e a luz de um grande sol!) Alguns dizem que foi operário para toda a obra, uma espécie de sucateiro ou cacharreiro capaz de tudo fazer, de em nada ver o inviável ou só com defeitos, de consertar o inenarrável. Era forte, dedicado, delicado e de quando em vez também ele dava com o mascoto rijo nos dedos e aleijava-se. Mas em mais ninguém como nele os lábios se moviam levemente para se ouvir com ternura e leveza: «Valha-me Deus!». E Ele ali tão perto, tão sereno, sorrindo e brincando com as fitas de madeira e os caracóis ao ar!
Maria disse sim e sim disse José. A Deus.
A história que segue passou-se algures num colégio católico. Era a preparação da festa de Natal e certo menino empenhara-se muito nos ensaios para fazer de São José no teatrinho do presépio. Era o menino perfeito para o papel: sério, sereno, cuidadoso. Pouco antes do teatrinho o menino adoeceu. Não faltou coisa que se fizesse a fim de o menino participar. Na véspera o pai ligou para o colégio informando que o menino não recuperara pelo que não iria à festa e não faria o seu papel. Do lado de lá fez-se ouvir uma resposta: – «Já é muito tarde para encontrar substituto. Vamos tirá-lo da peça e ninguém dará por isso.»
E foi assim que a figura de José foi tirada da representação sem que muitos dessem pela sua falta!
Parece que José conta pouco. Que conta pouco nesta história e em toda a história da salvação. Mas o certo é que o papel do José histórico é fundamental e imprescindível. O papel de José não se pode anular. Sem a sua presença a vida de Jesus seria muito de suspeitar e até inaceitável. E a vida de Maria nem sequer seria possível na comunidade da Nazaré natal.
Para executar o seu plano de salvação da humanidade Deus quis precisar da ajuda de Maria, e não precisou menos da de José.
Para nascer Deus precisou de Maria e de José. Jesus é fruto do Espírito Santo, mas para nascer precisou do consentimento de ambos. Precisou de Maria que era cheia de graça e precisou de José que era justo, silencioso, trabalhador, respeitado, sabia rezar e amar.
Deus precisa sempre de nós. Até para (nos) salvar.
José parece estar a mais na história do Natal, mas de um homem assim é que o natal de Deus precisa: um homem inteiro, franco e aberto, ágil e disponível, disposto a agir e sem medo das consequências, um homem capaz de Deus e de ir entendendo a Deus e os seus planos.
Há histórias de vida que nem Deus imagina, dizemos nós. E existem dias cheios de dramas e de dúvidas, dias em que não entendemos a Deus nem os seus planos, dias em que nos enciumamos por nos crermos esquecidos do seu amor, preteridos por outros.
Mais valia olhássemos para José, o quási-esquecido que o Evangelho logo esquece. Que drama ele viveu! Maria apareceu grávida e ele sem nada ter a ver com o assunto. Alguém pode imaginar os seus ciúmes? a sua preocupação? a sua dor? as suas dúvidas?
Eu imagino-o batendo à porta do Pároco: – E, agora, padre, que devo fazer? E o padre igualmente ferido de aflição rebuscando a solução por entre as letras das Escrituras...
Maria disse sim, e José disse-o também ou foi forçado a dizê-lo? – Não sei. Sei que coisas há que nem os párocos sabem como ajudar e vai daí, antes do divórcio, José, que era justo, pediu ao céu um sinal. E Deus deu-lho. Falou num sonho e disse-lhe: – José, tu não temas!
(Foi com essa candura que ele o contou a Maria antes de chorarem os dois!)
E José aceitou e acreditou no sinal de Deus.
E você é justo?
Chama do Carmo I NS 208 I Dezembro 22 2013
Dificilmente haverá santo mais simpático. Para começar não fala muito e ouve de tudo. Às vezes até penso que é Deus, porque só Deus está à altura de Deus para o educar. Jesus era Deus, e José educou-o. Que grande, que enorme era José! Outras vezes medito no terror que terá sofrido só por lhe ter tocado em sorte a obrigação de acolher a Deus, dar-lhe um nome, apresentá-lo à sociedade, fazer Dele um homem, ensiná-lo a ser bom judeu, ensiná-lo a rezar, dizer-lhe que o Pai era o pai.
Este IV domingo de Advento traz-nos José com as suas dúvidas e a sua fé. Na surpresa da sua anunciação.
Só de pensar nos trabalhos que José houve de passar assusto-me! Ainda bem que era justo; justo e santo. Deus Pai gostava tanto de José que lhe confiou o Filho. Mas não o livrou de uma dificuldade que fosse, não o livrou de medos, nem de surpresas, nem de dúvidas, nem de durezas – as provas da fé.
Trabalhou como carpinteiro. (Se fosse hoje seria – seria, sei lá! –, seria um designer, alguém que com um pouco de magia semeia no cinzento dos dias o calor e a luz de um grande sol!) Alguns dizem que foi operário para toda a obra, uma espécie de sucateiro ou cacharreiro capaz de tudo fazer, de em nada ver o inviável ou só com defeitos, de consertar o inenarrável. Era forte, dedicado, delicado e de quando em vez também ele dava com o mascoto rijo nos dedos e aleijava-se. Mas em mais ninguém como nele os lábios se moviam levemente para se ouvir com ternura e leveza: «Valha-me Deus!». E Ele ali tão perto, tão sereno, sorrindo e brincando com as fitas de madeira e os caracóis ao ar!
Maria disse sim e sim disse José. A Deus.
A história que segue passou-se algures num colégio católico. Era a preparação da festa de Natal e certo menino empenhara-se muito nos ensaios para fazer de São José no teatrinho do presépio. Era o menino perfeito para o papel: sério, sereno, cuidadoso. Pouco antes do teatrinho o menino adoeceu. Não faltou coisa que se fizesse a fim de o menino participar. Na véspera o pai ligou para o colégio informando que o menino não recuperara pelo que não iria à festa e não faria o seu papel. Do lado de lá fez-se ouvir uma resposta: – «Já é muito tarde para encontrar substituto. Vamos tirá-lo da peça e ninguém dará por isso.»
E foi assim que a figura de José foi tirada da representação sem que muitos dessem pela sua falta!
Parece que José conta pouco. Que conta pouco nesta história e em toda a história da salvação. Mas o certo é que o papel do José histórico é fundamental e imprescindível. O papel de José não se pode anular. Sem a sua presença a vida de Jesus seria muito de suspeitar e até inaceitável. E a vida de Maria nem sequer seria possível na comunidade da Nazaré natal.
Para executar o seu plano de salvação da humanidade Deus quis precisar da ajuda de Maria, e não precisou menos da de José.
Para nascer Deus precisou de Maria e de José. Jesus é fruto do Espírito Santo, mas para nascer precisou do consentimento de ambos. Precisou de Maria que era cheia de graça e precisou de José que era justo, silencioso, trabalhador, respeitado, sabia rezar e amar.
Deus precisa sempre de nós. Até para (nos) salvar.
José parece estar a mais na história do Natal, mas de um homem assim é que o natal de Deus precisa: um homem inteiro, franco e aberto, ágil e disponível, disposto a agir e sem medo das consequências, um homem capaz de Deus e de ir entendendo a Deus e os seus planos.
Há histórias de vida que nem Deus imagina, dizemos nós. E existem dias cheios de dramas e de dúvidas, dias em que não entendemos a Deus nem os seus planos, dias em que nos enciumamos por nos crermos esquecidos do seu amor, preteridos por outros.
Mais valia olhássemos para José, o quási-esquecido que o Evangelho logo esquece. Que drama ele viveu! Maria apareceu grávida e ele sem nada ter a ver com o assunto. Alguém pode imaginar os seus ciúmes? a sua preocupação? a sua dor? as suas dúvidas?
Eu imagino-o batendo à porta do Pároco: – E, agora, padre, que devo fazer? E o padre igualmente ferido de aflição rebuscando a solução por entre as letras das Escrituras...
Maria disse sim, e José disse-o também ou foi forçado a dizê-lo? – Não sei. Sei que coisas há que nem os párocos sabem como ajudar e vai daí, antes do divórcio, José, que era justo, pediu ao céu um sinal. E Deus deu-lho. Falou num sonho e disse-lhe: – José, tu não temas!
(Foi com essa candura que ele o contou a Maria antes de chorarem os dois!)
E José aceitou e acreditou no sinal de Deus.
E você é justo?
Chama do Carmo I NS 208 I Dezembro 22 2013
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Natal com Chesterton – Parte I
A antiga frase “o Natal está chegando” é especialmente apropriada para uma época em que esta é quase a única coisa a respeito da qual sabemos algo: que ela está chegando. Pode ser verdade, num sentido mais amplo, que o Natal esteja chegando: no sentido de que o Natal está voltando. O Natal pertence a uma ordem de ideias que nunca realmente pereceu, e seu desaparecimento é agora pouco provável. Ele teve de início uma espécie de glamour de uma causa perdida; foi como um por do sol eterno. São as coisas que nunca morrem que ganham a reputação de estarem moribundas.
Somos constantemente lembrados, especialmente por aqueles céticos empedernidos que parecem nunca ser capazes de dar um passo além em suas concepções, que muitos costumes do Natal são coisas pagãs. O que essas pessoas não veem é um fato muito interessante: que se essas coisas são pagãs, elas sobreviveram o paganismo. Se essas tradições foram tão fortes que sobreviveram a tão tremenda insurreição, como foi a mudança de toda a religião da Europa, a queda do império universal e o surgimento da Igreja universal, não parece impossível que elas possam sobreviver a alguns poucos mecanismos elétricos e a tateantes e ineficientes leis educacionais.
G. K. Chesterton
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