quarta-feira, 28 de maio de 2014

Voltarei!

Promessa. Celebramos o sexto domingo da Páscoa, domingo a que alguns quase chamam o último do tempo pascal. Na verdade, a Cinquentena Pascal está longe de estar concluída, por que cabe-nos celebrar ainda as solenidades da Ascensão e do Pentecostes. Porém, havemos de reparar no cuidado pedagógico da Igreja: a Páscoa é um só dia, é um todo, mas celebrado separadamente, quer se dizer, por que apresentada por partes ao nosso coração ajuda-nos a viver melhor e a celebrar melhor a grande alegria pascal — o Senhor Ressuscitado. A ressurreição de Jesus é um tão grande mistério ou realidade dinâmica que para o saborear bem deveremos procurar contemplá-la desde a riqueza dos diversos ângulos que se nos apresenta.
Antes de celebrar a Páscoa preparámo-la durante os quarenta dias precedentes, e depois celebrámo-la longamente no decurso dos cinquenta dias subsequentes. A Páscoa é portanto um quarto dos dias do ano. Tal peso tem de marcar-nos profundamente e obrigar--nos a olhar para Jesus de uma maneira encantadoramente feliz. A Páscoa é tão impactante que durante os cinquenta dias pascais vão passando aos nossos olhos e pelo nosso coração os dias de Jesus, melhor dito, os seus últimos dias, sobretudo, os que começam com o último tramo da subida à cidade de Jerusalém — onde haveria de entregar-se livre e totalmente através da sua paixão, morte e ressurreição. O acesso à compreensão de tão terrível e obscuro drama humano vivido por Jesus e por extensão os seus discípulos é tarefa assaz difícil, mais e mais porque na morte de Jesus eles viram frustrados os seus planos de glória e de triunfo pessoais. Mas mais difícil ainda é entrar definitivamente para dentro do cenário jubiloso e triunfante da Páscoa, por que os dias da Páscoa têm, para nós, uma marca muito profunda: a vitória de Jesus. E a sua vitória é a luminosa correspondência à sua glorificação, e a glorificação de Jesus é conforto para os seus discípulos. As sucessivas aparições do Ressuscitado confortam e animam os discípulos singularmente e em comunidade
— «Não tenhais medo!», diz-nos Ele.
E dá-lhes (-nos) a Sua paz.
Bem me parecia que se não se passar pelo sentimento depressivo da perda de Jesus, que desaparece da nossa vista tragado pela morte, não saberíamos como se haveria de instalar em nós a alegria de O (pre)sentirmos para sempre presente por que ressuscitado.
(Tal como a aurora anuncia a vitória da luz sobre a noite, assim a ressurreição é vitória confirmada sobre a morte, porque o Ressuscitado é o Crucificado, o Glorificado é o que esteve morto.)
A Páscoa é a certeza da presença. É a vida de Jesus no coração dos seus amigos e da sua Igreja: Jesus está, de facto, de novo, connosco. Para sempre. Muitas coisas dissera e prevenira Ele anteriormente. A Última Ceia, por exemplo, foi densamente entranhável, razão pela qual os Apóstolos perceberam quase nada. E como eles os discípulo de hoje, cada um à sua maneira, não percebe ou vai percebendo quase nada de Jesus, pelo que nos cabe ir fazendo o nosso caminho com o Espírito Santo que há-de recentrar-nos de novo na verdade do coração de Jesus, que só nos ama e por isso vem para nós.
Procuremos todos ir caminhando. Com Jesus. Caminhar escutando a Palavra; caminhar desde os carreiros dos nossos mundinhos para as avenidas de Deus.
Nestes domingos da Páscoa temos escutado o Discurso de Despedida, que, segundo João, Jesus falou aos seus discípulos depois da Última Ceia, prevenindo-os do seu desaparecimento. Disse--lhes ainda muitas outras coisas; disse-lhes palavras ao coração que eles não souberam ouvir por não estarem preparados para tal; disse-lhes que o Espírito Santo viria como defensor deles e também para recordar-lhes tudo o que anteriormente Lhes dissera. A poucas horas de ser traído por um dos seus e de entrar na sua paixão, e perante tamanha perturbação dos seus, Jesus parece que desliga da sua angústia e se lhes revela ainda mais próximo, mais amigo, mais irmão, dizendo-lhes: «Eu voltarei!», «Não vos deixarei órfãos!».
Ó palavras estupendas, claras, cheias de promessa e de vitória. Jesus promete voltar! Podemos crê-lo? Como poderemos estar certos? Eis a única resposta possível: O Espírito Santo que o Ressuscitado há-de derramar em nós fá-Lo-á habitar em nossos corações, e nós experimentaremos o Vivente em nós como Presença real e actuante.
São Paulo ensina que ninguém pode dizer «Jesus é o Senhor» se não fôr previamente inspirado pelo Espírito, e é só porque vivemos no Espírito Santo que experimentamos todos os dias Jesus como Alguém presente e vivo, ou, por outras palavras, só pelo Espírito é que sabemos que Ele regressa para nós e nós vêmo-Lo de verdade!

Chama do Carmo I NS 230 I Maio 25 2014

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