A Palavra de Deus pronunciada no seio das nossas comunidades neste III Domingo
de Páscoa recorda-nos um facto histórico tremendo, ao mesmo tempo misterioso e doloroso. Perante os judeus Pedro tomou a Palavra para declarar que o Povo que tanto esperara o Messias, por fim não acolhera o Messias!
E tudo terminou num desastre: "Vós rejeitastes o Santo e o Justo. Vós matastes o Autor da vida. Vós o entregastes e o rejeitastes diante de Pilatos".
Eis, a verdade: o Povo tão amado de Deus não foi capaz de reconhecer a presença do Messias que lhe fora enviado e entregou-O a Pilatos, o governador romano, que O mandou crucificar. Não culpemos os judeus porque a própria Palavra do Deus afirma: "Eu sei que agistes por ignorância, assim como vosso chefes. Deus, porém, cumpriu desse modo o que havia anunciado pela boca de todos os profetas: que o seu Cristo haveria de sofrer".
Que mistério a rejeição dos judeus! Como pôde um povo tão cheio de fé e ansioso do Messias de Deus levar Cristo à cruz, e sem saber cumprir o plano de Deus?
A mesma coisa, por sua vez, afirma Jesus no Evangelho de hoje: "Assim está escrito: O Messias sofrerá e ressuscitará dos mortos ao terceiro dia, e no seu Nome serão anunciados a conversão e o perdão dos pecados a todas as nações".
Mas, por que deveria ser assim? Por que o plano de Deus teve de passar pela cruz tão feia, tão humilhante, tão dolorosa e sofrida?
Sim, a cruz fazia parte do plano de Deus.
Primeiro, porque nela se manifesta o que o pecado fez com o homem e do que o homem pecador se tornou capaz de fazer: de matar a Deus e se condenar a si mesmo. A humanidade pecadora – esta, que vemos hoje – de tal modo se fechou para Deus que O está matando.
Desde o início da história temos matado Deus, renegando-O, desobedecendo-Lhe, colocando-O em último lugar... Mas, simultaneamente, quando fazemos isso, destruímos-nos, desfiguramos-nos, edificamos a nossa vida pessoal e social sobre a inconsistência da areia. No mistério da cruz de Jesus, Deus nos mostra a gravidade do nosso pecado: o desastre da humanidade quando se fecha a Deus. Num mundo que brinca com o pecado e já não leva a sério a gravidade de pecar, olhemos a cruz de Jesus e veremos o que nosso pecado provoca! E assim, jamais deixará de nos impressionar a frase de São Pedro na primeira leitura de hoje: "Vós matastes o Autor da Vida!"
Eis que com o nosso pecado matámos Aquele que é a Vida e por fim nos matámos a nós!
Porém, a cruz revela também, com toda a força, até onde Deus é capaz de ir por nós: Ele é capaz de se entregar, de dar totalmente a sua vida por nós! Enfim, reparemos que o Pai tudo nos dá no Filho quanto de precioso tem!
No Filho, feito homem de dores, humilhado e derrotado, nós podemos compreender o quanto somos amados por Deus, o quanto Ele nos leva a sério, o quanto Deus é capaz de descer para nos procurar! Contemplemos a cruz e sejamos gratos a Deus que assim se nos entrega!
Por fim, a cruz revela-nos a sempre desconcertante fidelidade de Deus: nela descobrimos o verdadeiro nome do nosso Deus. O nome do nosso Deus é Fidelidade, o seu nome é Amor! Deus é fidelidade e amor do Pai em relação ao Filho. Ao Filho amado que se entregou ao Pai por nós, Deus-Pai o ressuscitou e deu-Lhe toda glória. É o que anuncia a primeira leitura de hoje: "O Deus de nossos Pais glorificou o seu servo Jesus. Vós matastes o Autor da Vida, mas Deus o ressuscitou dos mortos!"
Que mistério!
O Filho entrega-se ao Pai com toda a confiança e todo o abandono; por fim, o Filho, feito homem de dores, é glorificado pelo Pai e colocado no mais alto da glória!
Deus jamais abandona os que a Ele se confiam. Podemos imaginar o Senhor Jesus dizendo as palavras do Salmo de hoje: "Em paz me deito e adormeço tranquilo, pois só vós, Senhor Deus, dais segurança à minha vida!"
O nosso Salvador adormeceu no sono da morte certo que o Pai o acordaria para a vida! Sim, o Pai é fidelidade, o Pai é amor a Jesus! Mas, é também fidelidade e amor para conosco. Tudo quanto aconteceu com o Filho na cruz foi por nós, para nossa salvação, por que, afinal, também nós condenamos Jesus depois tanto vermos sem ver!
Chama do Carmo I NS 146 I Abril 22 2012
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