A pregação de João Baptista sacudiu a consciência das gentes do seu tempo. Aquele profeta que chegava do deserto dizia em voz alta o que eles sentiam no coração: que era necessário mudar, regressar a Deus, preparar-se para acolher o Messias. A sua pregação tocava as gentes.
Alguns demoravam-se algo mais a ouvi-lo e perguntavam-lhe: O que devemos fazer?
Segundo o relato do Evangelho deste domingo, terceiro deste Advento, três tipos de gente rodeavam João Baptista, a saber: as multidões indiferenciadas, alguns publicanos e os soldados. Buscando solução para as suas vidas todos questionavam o Profeta com a mesma pergunta: que devemos fazer?
E a quem o interpelava João respondia com uma recomendação particular: repartir o que se possuía em excesso; ser-se benevolente; e recusar o uso de violência injusta.
Sublinhemos aqui a sensibilidade de João. Nas respostas às interpelações dos seus contemporâneos jamais se perdeu em teorias sublimes sobre a sociedade; jamais impôs novas práticas religiosas; jamais sugeriu uma fuga em massa para o deserto como forma de penitência. João usou linguagem profética directa, e tudo resumiu numa fórmula simples: «Aquele que tiver duas túnicas que as reparta com quem não tem nenhuma; o que tem comida que faça o mesmo.»
A palavra de João foi um sincero apelo à conversão, mas uma conversão visível em atitudes, visível na prática da vida. A primeira tem a ver com a possibilidade de partilhar com o necessitado. Ao longo da vida todos podemos dar algo. O que temos vale pouco se só o temos para nós; mais que para guardar e entesourar o que possuímos é para administrar. Algo temos em excesso que devamos partilhar: ou alegria ou sorriso, ou roupa ou dinheiro, ou amizade ou tempo, ou o saber ou as mãos que acariciam. Ninguém é tão pobre que não possa repartir com quem necessita. E é por aí que deve começar a conversão.
Aos publicanos que o interrogaram, João respondeu: «Não exijais mais que o que se encontra estabelecido». Isto é, a conversão exige a quem tem poder que não seja ditador! E de alguma forma todos temos algum poder. O sacerdote tem poder, o pai e a mãe têm poder, e o professor, e todos e tantos e até o jovem na força da sua juventude pode afirmar o poder da sua rebeldia! Aos guardiões do poder pede-se-lhes que não abusem do seu poder! Aos que possuem o poder da beleza, do dinheiro e da inteligência, da simpatia, da saúde ou da força física, João advertiu: Se usares o teu poder apenas em teu favor ou em favor dos da tua casta estás a abusar do poder! És um ditador!
Primeiro, disse João, partilhai; depois, não abuseis do poder. Por último, aos militares João disse-lhes algo parecido: «Não pratiqueis extorsão sobre ninguém; não denuncieis injustamente; e contentai-vos com o vosso soldo.» Isto é também para nós, sobretudo para nós. É um aviso sério, como se o Profeta dissera: evitai a inveja, e, sobretudo, fazei crescer em vós o gosto pelas coisas de Deus, pelas coisas espirituais que não ferem!
O Evangelho traz-nos pela boca de João três poderosos conselhos que não podemos ignorar neste dia (alegre) de conversão. E se alguém nos perguntar se serão ainda mais actualizáveis, teremos nós neste domingo de Advento dedicado à alegria, de nos perguntar o que podemos fazer para acolher a Cristo no meio desta sociedade em crise. E deveríamos começar por não entorpecer a consciência e abrir os olhos para a realidade, pois deveríamos conhecer com toda a crueza o sofrimento que se cria por causa da insolidariedade que ajudamos a promover. Poderá a generosidade viver de impulsos? Ou, não valerá mais promover uma vida sóbria, uma vida que aceite baixar o nível de bem-estar a fim de partilharmos com os mais necessitados tantas coisas que temos e das quais não necessitamos para viver? Teremos nós ainda atenção suficiente para quem vive desamparado, não acede aos devidos apoios de saúde ou sociais cada vez mais exíguos?
Há já quem mire o futuro com medo e impotência: como poderemos acalentar neles a esperança em tempos de gelo e saraiva?
A crise vai ser longa, dizem os sábios. Teremos nos próximos anos muitas e válidas oportunidades de humanizar o consumismo ocidental meio louco e de denunciar o sofrimento insuportável e injusto de tantos. Vamos os cristãos ter oportunidade de crescer em solidariedade prática. De contrário, porque haveríamos de merecer receber de novo a Cristo nas nossas vidas?
Chama do Carmo I NS 167 I Dezembro 16 2012
Sem comentários:
Enviar um comentário