Somos Carmelitas Descalços, filhos de Santa Teresa de Jesus e São João da Cruz, Ordem dos Irmãos da Bem-aventurada Virgem Maria do Monte Carmelo, Senhora do Sim, nossa Mãe e nossa Irmã, em Viana do Castelo, Alto Minho, Portugal, a viver «em obséquio de Nosso Senhor Jesus Cristo e a servi-l’O de coração puro e consciência recta».
domingo, 3 de março de 2013
Crer na caridade suscita caridade (excertos)
Queridos irmãos e irmãs!
A celebração da Quaresma, no contexto do Ano da fé, proporciona-nos uma preciosa ocasião para meditar sobre a relação entre fé e caridade: entre o crer em Deus, no Deus de Jesus Cristo, e o amor, que é fruto da acção do Espírito Santo e nos guia por um caminho de dedicação a Deus e aos outros.
Na minha primeira Encíclica, deixei já alguns elementos que permitem individuar a estreita ligação entre estas duas virtudes teologais: a fé e a caridade. Partindo duma afirmação fundamental do apóstolo João: «Nós conhecemos o amor que Deus nos tem, pois cremos nele», recordava que, «no início do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo. Dado que Deus foi o primeiro a amar-nos, agora o amor já não é apenas um “mandamento”, mas é a resposta ao dom do amor com que Deus vem ao nosso encontro». A fé constitui aquela adesão pessoal à revelação do amor gratuito e «apaixonado» que Deus tem por nós e que se manifesta plenamente em Jesus Cristo.
[...] O cristão é uma pessoa conquistada pelo amor de Cristo e, movido por este amor, está aberto de modo profundo e concreto ao amor do próximo. Esta atitude nasce, antes de tudo, da consciência de ser amados, perdoados e mesmo servidos pelo Senhor, que Se inclina para lavar os pés dos Apóstolos e Se oferece a Si mesmo na cruz para atrair a humanidade ao amor de Deus.
[...] Toda a vida cristã consiste em responder ao amor de Deus. A primeira resposta é precisamente a fé como acolhimento, cheio de admiração e gratidão, de uma iniciativa divina inaudita que nos precede e solicita; e o «sim» da fé assinala o início de uma luminosa história de amizade com o Senhor, que enche e dá sentido pleno a toda a nossa vida. Mas Deus não se contenta com o nosso acolhimento do seu amor gratuito; não Se limita a amar-nos, mas quer atrair-nos a Si, transformar-nos de modo tão profundo que nos leve a dizer, como São Paulo: Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim. Quando damos espaço ao amor de Deus, tornamo-nos semelhantes a Ele, participantes da sua própria caridade.
Abrirmo-nos ao seu amor significa deixar que Ele viva em nós e nos leve a amar com Ele, n’Ele e como Ele; só então a nossa fé se torna verdadeiramente uma «fé que atua pelo amor» e Ele vem habitar em nós. A fé é conhecer a verdade e aderir a ela.
[...] À luz de quanto foi dito, torna-se claro que nunca podemos separar e menos ainda contrapor fé e caridade. Estas duas virtudes teologais estão intimamente unidas, e seria errado ver entre elas um contraste ou uma «dialética». Na realidade, se, por um lado, é redutiva a posição de quem acentua de tal maneira o carácter prioritário e decisivo da fé que acaba por subestimar ou quase desprezar as obras concretas da caridade reduzindo-a a um genérico humanitarismo, por outro é igualmente redutivo defender uma exagerada supremacia da caridade e sua operactividade, pensando que as obras substituem a fé. Para uma vida espiritual sã, é necessário evitar tanto o fideísmo como o activismo moralista.
A existência cristã consiste num contínuo subir ao monte do encontro com Deus e depois voltar a descer, trazendo o amor e a força que daí derivam, para servir os nossos irmãos e irmãs com o próprio amor de Deus.
[...] Não há acção mais benéfica e, por conseguinte, caritativa com o próximo do que repartir-lhe o pão da Palavra de Deus, fazê-lo participante da Boa Nova do Evangelho, introduzi-lo no relacionamento com Deus: a evangelização é a promoção mais alta e integral da pessoa humana.
[...] Enquanto dom e resposta, a fé faz-nos conhecer a verdade de Cristo como Amor encarnado e crucificado, adesão plena e perfeita à vontade do Pai e infinita misericórdia divina para com o próximo; a fé radica no coração e na mente a firme convicção de que precisamente este Amor é a única realidade vitoriosa sobre o mal e a morte. A fé convida-nos a olhar o futuro com a virtude da esperança, na expectativa confiante de que a vitória do amor de Cristo chegue à sua plenitude.
[...] desejo a todos vós que vivais este tempo precioso reavivando a fé em Jesus Cristo, para entrar no seu próprio circuito de amor ao Pai e a cada irmão e irmã que encontramos na nossa vida. Por isto elevo a minha oração a Deus, enquanto invoco sobre cada um e sobre cada comunidade a Bênção do Senhor!
Benedictus PP. XVI
Chama do Carmo I NS 178 I Março 3 2013
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