sábado, 5 de maio de 2012

Carta a minha mãe

Como não pensar em ti, mãe, no dia em que para mim, como para muitos, continua a ser o verdadeiro Dia da Mãe?
Sei, mãe, que por aí, a contragosto meu, os dias continuam frios e um pouco escuros demais.
Outrora, mas não há muito, na última Primavera, por exemplo, os ossos doeram-te na mesma, as rugas denunciaram os mesmos dias de dureza, passada e presente, os achaques foram os mesmos, o sono foi curto como sempre.
Mas o frio não era o mesmo. E não falo assim por causa destes líquidos dias de chuva intermitente e fria. Falo assim, porque também eu tenho mais frio nesta percalço de Primavera de 2012. Desde que me lembro nunca passei tanto frio como nos últimos dias. E não sei como nem porquê ele aumenta quando me lembro que o próximo domingo é Dia da Mãe!
Mas sei bem que o Dia da Mãe são todos os dias, todos os dias, todos os dias mesmo, mãe.
Ainda me lembro do teu rosto sem rugas. Ainda me lembro do teu passo ágil e ligeiro. Ainda me lembro dos teus braços fortes. Ainda me lembro que nesse tempo de sol quente não havia Dia da Mãe. Porque tu eras mãe todos os dias! Eu e meus irmãos tivemos mãe todos os dias! Mas agora há Dia da Mãe, talvez porque haja mais coisas para comprar para mães a menos. Ou com tempo a menos.
Sim, mãe, até hoje não me falhaste. Por isso até hoje não senti tanto frio como sinto.
Tinhas as tuas ideias e um caminho para escoá-las. Lembro-me bem, sobretudo, da tua época áurea, a época dos teus sonhos, dos nossos sonhos, dos meus sonhos. Lembro-me bem que começou a amanhecer. E no amanhecer fui buscando o meu caminho, enfrentando novos horizontes, acaudalando sonhos diferentes, perspectivando novas soluções, buscando outros águas, outros prados, outros rumos.
Começaste aí a ser mais mãe. Vias-me de longe e sobretudo de longe a longe. Mas vias-me, e eu sei que os filhos gostamos que as mães nos vejam quando procuramos equilibrar-nos nos primeiros andamentos de bicicleta.
Não nasci, como bem sabes, para ficar no ninho ou por perto dele. E a bicicleta tem-me levado para longe de ti. Mas tem piada! Agora reparo que aprendeste a ligar o computador e até criaste uma conta de mail! Que de quando em vez me envias uns mail pequeninos, que começam: «Querido filho», e eu oiço a tua voz e abrando ou páro a bicicleta e olho para trás perscrutando o que te aflige, temendo que tenhas tu caído e partido outra perna!
Agora que sei que entras com frequência no www.chamadocarmo.blogspot.pt e no www.carmojovem.blogspot.pt sei-te ainda mais perto e atenta. Vigilante como sempre. Agora que és avó vejo-te ainda mais interessada nos filhos, apesar de achacada e atacada pela viuvez.
Sim, é isso. Esse é que é o frio de que tanto me custa falar, por que não estávamos habituado a ele. E, meu Deus, como haveremos de habituar-nos? Ah, mas que fogo nos há-de aquecer a ausência?
Agora voltas a ser novamente mãe e pai! Não foi assim que cresci, vendo-te a fazer girar a mó do moinho e a pegar na rabiça do arado? Agora, porém, as tuas mãos já não têm força e esmaeceram sob o sol fresco da Primavera. Peço por isso a Deus, a Quem elas se vão erguendo, para por ti Ele nos abençoar, abençoar os filhos e as netas, os nossos sonhos, labutas e combates.
Agora que voltas a ser mãe e pai, lembro-me bem das curvas do teu colo, do teu regaço onde sabia bem adormecer, por que lá jamais treparam dragões, por que desde lá jamais se viam fantasmas ou guerras, jamais se sentia medo ou terror algum.
Agora que voltas a ser mãe e pai, quero lembrar-me bem que foi à lareira do teu colo que eu aprendi a fé, que primeiro amei Jesus e Maria, José, os Santos, o Santo Padre e a Bíblia.
Agora que voltas a ser mãe e pai oro duplamente por ti ao Pai. Rezo-lhe para que vele por ti, que é o mesmo que velar por nós.
Fico sem palavras agora que voltas a ser mãe e pai. Di-las-ei qualquer dia, num outro qualquer dia da mãe. Agora aceita, simplesmente, a minha oração por ti, ó mãe.
Teu,
Chama do Carmo I NS 148 I Maio 6 2012

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