sábado, 21 de dezembro de 2013

José da Anunciação, o homem a mais na história

São José. A menina Virgem Maria teve a visita de um Anjo; o jovem José também. O Anjo falou em nome de Deus à menina; e a José também. À menina disse-lhe que ia ser mãe, a José que ia ser pai. A menina soube que ia ser por milagre, José soube que o que estava a acontecer era o Milagre. Maria assustou-se com a notícia, José — só podia! — também!
Dificilmente haverá santo mais simpático. Para começar não fala muito e ouve de tudo. Às vezes até penso que é Deus, porque só Deus está à altura de Deus para o educar. Jesus era Deus, e José educou-o. Que grande, que enorme era José! Outras vezes medito no terror que terá sofrido só por lhe ter tocado em sorte a obrigação de acolher a Deus, dar-lhe um nome, apresentá-lo à sociedade, fazer Dele um homem, ensiná-lo a ser bom judeu, ensiná-lo a rezar, dizer-lhe que o Pai era o pai.
Este IV domingo de Advento traz-nos José com as suas dúvidas e a sua fé. Na surpresa da sua anunciação.
Só de pensar nos trabalhos que José houve de passar assusto-me! Ainda bem que era justo; justo e santo. Deus Pai gostava tanto de José que lhe confiou o Filho. Mas não o livrou de uma dificuldade que fosse, não o livrou de medos, nem de surpresas, nem de dúvidas, nem de durezas – as provas da fé.
Trabalhou como carpinteiro. (Se fosse hoje seria – seria, sei lá! –, seria um designer, alguém que com um pouco de magia semeia no cinzento dos dias o calor e a luz de um grande sol!) Alguns dizem que foi operário para toda a obra, uma espécie de sucateiro ou cacharreiro capaz de tudo fazer, de em nada ver o inviável ou só com defeitos, de consertar o inenarrável. Era forte, dedicado, delicado e de quando em vez também ele dava com o mascoto rijo nos dedos e aleijava-se. Mas em mais ninguém como nele os lábios se moviam levemente para se ouvir com ternura e leveza: «Valha-me Deus!». E Ele ali tão perto, tão sereno, sorrindo e brincando com as fitas de madeira e os caracóis ao ar!
Maria disse sim e sim disse José. A Deus.
A história que segue passou-se algures num colégio católico. Era a preparação da festa de Natal e certo menino empenhara-se muito nos ensaios para fazer de São José no teatrinho do presépio. Era o menino perfeito para o papel: sério, sereno, cuidadoso. Pouco antes do teatrinho o menino adoeceu. Não faltou coisa que se fizesse a fim de o menino participar. Na véspera o pai ligou para o colégio informando que o menino não recuperara pelo que não iria à festa e não faria o seu papel. Do lado de lá fez-se ouvir uma resposta: – «Já é muito tarde para encontrar substituto. Vamos tirá-lo da peça e ninguém dará por isso.»
E foi assim que a figura de José foi tirada da representação sem que muitos dessem pela sua falta!
Parece que José conta pouco. Que conta pouco nesta história e em toda a história da salvação. Mas o certo é que o papel do José histórico é fundamental e imprescindível. O papel de José não se pode anular. Sem a sua presença a vida de Jesus seria muito de suspeitar e até inaceitável. E a vida de Maria nem sequer seria possível na comunidade da Nazaré natal.
Para executar o seu plano de salvação da humanidade Deus quis precisar da ajuda de Maria, e não precisou menos da de José.
Para nascer Deus precisou de Maria e de José. Jesus é fruto do Espírito Santo, mas para nascer precisou do consentimento de ambos. Precisou de Maria que era cheia de graça e precisou de José que era justo, silencioso, trabalhador, respeitado, sabia rezar e amar.
Deus precisa sempre de nós. Até para (nos) salvar.
José parece estar a mais na história do Natal, mas de um homem assim é que o natal de Deus precisa: um homem inteiro, franco e aberto, ágil e disponível, disposto a agir e sem medo das consequências, um homem capaz de Deus e de ir entendendo a Deus e os seus planos.
Há histórias de vida que nem Deus imagina, dizemos nós. E existem dias cheios de dramas e de dúvidas, dias em que não entendemos a Deus nem os seus planos, dias em que nos enciumamos por nos crermos esquecidos do seu amor, preteridos por outros.
Mais valia olhássemos para José, o quási-esquecido que o Evangelho logo esquece. Que drama ele viveu! Maria apareceu grávida e ele sem nada ter a ver com o assunto. Alguém pode imaginar os seus ciúmes? a sua preocupação? a sua dor? as suas dúvidas?
Eu imagino-o batendo à porta do Pároco: – E, agora, padre, que devo fazer? E o padre igualmente ferido de aflição rebuscando a solução por entre as letras das Escrituras...
Maria disse sim, e José disse-o também ou foi forçado a dizê-lo? – Não sei. Sei que coisas há que nem os párocos sabem como ajudar e vai daí, antes do divórcio, José, que era justo, pediu ao céu um sinal. E Deus deu-lho. Falou num sonho e disse-lhe: – José, tu não temas!
(Foi com essa candura que ele o contou a Maria antes de chorarem os dois!)
E José aceitou e acreditou no sinal de Deus.
E você é justo?
Chama do Carmo I NS 208 I Dezembro 22 2013

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