quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Narração da fundação do Carmelo de São José de Ávila (III)

«Importou tanto o não tardar eu nem mais um dia para o que tocava ao negócio desta bendita casa, que não sei como se poderia concluir se eu então me demorasse. Oh! grandeza de Deus! Muitas vezes me espanto, quando considero e vejo quão particularmente queria Sua Majestade ajudar-me para que se efectuasse este cantinho de Deus, pois creio que o é, e morada onde Sua Majestade se deleita, como uma vez, estando eu em oração, me disse que, esta casa era para Ele paraíso de deleite. E assim parece Sua Majestade ter escolhido as almas que trouxe para aqui, em cuja companhia vivo com tanta, tanta confusão. Nem eu as soubera desejar tais para esta vida de tanta austeridade, pobreza e oração. E levam-na com uma alegria e contento tal, que cada uma se acha indigna de ter merecido vir para este lugar. Em especial, há algumas que o Senhor chamou de entre muita vaidade e galas do mundo, onde poderiam estar contentes conforme as suas leis, e tem-lhes dado o Senhor aqui tão dobrados gozos, que elas claramente reconhecem ter-lhes dado cem por um do que deixaram e não se fartam de dar graças a Sua Majestade. A outras, tem Ele mudado de bem para melhor. Às de pouca idade dá fortaleza e conhecimento para que não possam desejar outra coisa e entendam que, ainda mesmo cá em baixo, é viver em maior descanso o estarem apartadas de todas as coisas da vida. Às que são de mais idade e com pouca saúde, dá forças, e lhas tem dado, para poderem levar a aspereza e penitência como as outras.
Oh! Senhor meu, como mostrais que sois poderoso! Não é mister buscar razões para o que Vós quereis, porque, por sobre toda a razão natural, fazeis as coisas tão possíveis que dais bem a entender que mais não é meu, façais tudo fácil. Aqui bem se pode dizer: «fingis trabalho em vossa lei», porque eu não o vejo, Senhor, nem sei como «é estreito o caminho que a Vós leva». Caminho real, vejo que é, e não senda; caminho onde, quem nele entre de verdade, vai mais seguro. Muito longe estão os recifes e despenhadeiros para cair, porque estão longe das ocasiões. Senda ruim e caminho apertado chamo eu o que, dum lado tem um vale muito profundo onde se pode cair, e do outro um despenhadeiro. Ainda mal se descuidam, os que por aí seguem, quando se despenham e fazem em pedaços.»
(Vida 35, 1)

Sem comentários: