No Domingo do Bom Pastor, o IV de Páscoa, a Igreja celebra mundialmente uma jornada de oração pelas vocações. A acuidade desta jornada é tal que não é jornada dum só dia,
mas duma semana. É alias, uma tarefa de toda a vida. É uma intenção que alguns de nós
mantêm viva enquanto têm forças no corpo e na alma. Este Dia ajuda a recordar que todos os dias precisamos todos de rezar pelos operários que se dedicam às grandes messes da humanidade inquieta, para que mais mãos e mais corações operários a elas se dediquem.
Bento XVI escreveu uma Carta para este Dia falando-nos da confiança que havemos de ter na iniciativa de Deus e da atenta resposta humana. Mas o que mais ressalta no conjunto de subsídios para este Dia talvez seja a Oração pelas Vocações.
Parece diferente.Não sei quem seja o autor da dita Oração. Provavelmente é obra duma equipa de trabalho, mais que dum indivíduo. Concerteza que não é anónima, mas comunitária e eclesial; para ser rezada aqui, ali e além, nas diferentes comunidades. Ouvi-a bastas vezes no www.myspace.com/vocacoes. Pareceu-me diferente: chama-se
Dai-nos rostos claros.
A oração é sempre dirigida ao Deus do diálogo que na carta que nos dirigiu, a Bíblia, escreveu algum dia: «Eu tenho as minhas delícias em estar com os filhos dos homens».
A oração deste ano pelas vocações acho-a mais bela, por me parecer mais diálogo e diálogo mais realista. Parece ter em conta esse gosto de Deus estar connosco, como se vê, por exemplo, na promessa de Jesus: «Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos».
Deus tem muitas maneiras de estar connosco. Está nos sacramentos, mas também na pobreza e na virgindade consagradas, nos que oram sem cessar, nas mãos que tocam com carinho, nas vidas que se desgastam como velas de altar.
Mas que diálogo é esse que tanto me impressiona?
«Nós sabemos que as vocações são um dom»
Nesta oração, dirigimo-nos a Deus dizendo-Lhe essa verdade imensa que O reconhece como Senhor de tudo, e que tudo chama à vida. Dele tudo vem, a Ele tudo vai. É uma verdade simples, mas não existe melhor atitude que a simplicidade quando se está (como um pobre) diante de Deus!
«Rostos claros de pessoas felizes»
Pedimos depois que atenda a nossa prece; e nela vai toda a urgência de mais operários e mais apóstolos, para serem enviados aos deserdados do Evangelho.
Esta oração pelas vocações denuncia vontade de partilhar, nunca de amealhar. Porém, não pede sem mais, antes qualifica o que pede (e a necessidade sentida): Corações puros, testemunhos santos, rostos claros.
É sugestivo o pedido de rostos claros: Talvez se subentenda aquele provérbio que diz que o rosto é o espelho da alma. Ora, almas claras são como lâmpadas na noite, como focos na cabeça de mineiros escuros, como faróis que rasgam noites tempestuosas! (Faz mesmo sentido rezar assim!)
«Não Vos importa que nos faltem?...»
A segunda parte da oração é mesmo ousada! Parece um queixume, uma denúncia, ou até simples desmesura em forma de grito desesperado dum naufrago.
É pura ousadia!
Há quem julgue que com Deus não se fala assim. Talvez seja verdade. Mas também é verdade que nos faltam mestres de paciência; apóstolos que sinalizem a beleza profunda — qual Bela adormecida! — dormindo no mais profundo centro de nós mesmos; operários e artesãos que conheçam e saibam pôr-nos em sintonia com a voz do Bom Pastor.
E se nos faltam convém que os peçamos com a simplicidade dum filho a pedir ao pai! Não que Deus não saiba, porque Deus bem sabe o que (mais) precisamos. Não é por isso que rezamos. Na verdade, não precisamos de acordar Deus ou lembrá-lo das nossas necessidades. Deus não é tão mesquinho, tão raquítico. Deus é como uma torrente avassaladora que dia a dia, e até quando dormimos, se vai derramando sobre nós. Que devemos fazer para beber da sua água? Abrir‑nos, simplesmente abrir a nossa taça,
limpá-la dos engulhos que a atulham, colar as gretas que a negam a si mesma.
Sim, vale a pena pedir a Deus com veemência: com o sentido de que quem mais precisa de ser informado é quem pede, não a Quem se pede...
«Cumprindo as indicações de Jesus»
E cumprindo as indicações de Jesus que nos ensinou a pedir, interceder, insistir..., que nos disse que o Pai dará o que é bom a quem Lho pede. É isso que havemos de fazer: bater à porta de Deus e à porta dos corações fortes, despojados e livres para O seguir. Não suceda que fiquemos morrendo de sede, sob a Torrente, com uma taça furada na mão!
Eis a razão pela qual rezamos: Temos sede e já quase não sabemos que temos sede!
Chama do Carmo I NS29 I 3 de Maio 2009
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