domingo, 14 de março de 2010

Poesia para um retiro (I)

É demasiado, Senhor, é demasiado…!

É demasiado, Senhor, é demasiado…!
Não posso mais! Ajuda-me!
Baile de batas brancas. Rostos assépticos. Sorrisos fingidos.
Desfile de amigos que se sentem violentos.
Meias palavras e cochichos.
Olhares fugídios.
É demasiado, Senhor, é demasiado…!
Perfusão atrás de perfusão,
já perdi o gosto do pão.
Cateteres exploram o meu corpo,
pobre corpo dependente, despojado,
que já não tem intimidade…
È demasiado, Senhor, é demasiado…!
Não me abandones nem me deixes cair em desespero;
o meu coração perturba-se e revolta-se,
dia e noite me corrói a angústia.
Não tenho forças nem para chorar,
e já nem sei como rezar,
as palavras desapareceram
e os que os outros dizem fatiga-me.
Não sou mais do que um corpo ferido,
um pobre animalzito farto de sofrer
e com um medo espantoso da morte.
É demasiado, Senhor, é demasiado…!
No meio deste silêncio espesso, abre o meu coração à tua discreta
e fiel presença.
Sossega-me. Fortalece-me.
Dá-me força para lutar contigo.
e abandonar-me, dia após dia, ao teu amor.
A tua luz ilumine a minha noite
como o sol que acaricia o bordo da minha cama.
Volta para mim o Teu rosto.
Em tuas mãos ponho meu espírito.
Creio, Senhor, que está Vivo
e que teu Amor é mais forte que a dor e que a morte.

M. Habaut
Recolha de Rudesindo Delgado

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